Utilização de 2 CCTs Diferentes - Uma para Cada Posto

Prezados(as) colegas, bom dia!

Estou com uma dúvida quanto a utilização de CCTs no certame. Estamos licitando, mediante pregão eletrônico, 2 itens em grupo único, assim subdivididos: 39 postos de escriturário e um posto de supervisor dos escriturários. As CBOs são, para o cargo de escriturário, CBO 4110-05, e para o de supervisor, CBO 4101-05.

A CCT utilizada como referência, RJ000713/2021, prevê os seguintes pisos salariais, R$ 1.862,08 para Escriturário Datilógrafo e R$ 3.321,39 para Supervisor.

Algumas licitantes estão se utilizando de CCT diversa da utilizada como referência, a RJ001053/2021, o que, a priori, não haveria óbice. Todavia, nesta CCT, o cargo de escriturário não é explícito. Nela assim está descrito: “R$ 1.304,92: para as demais funções administrativas”. Como percebemos, o piso salarial é muito menor que o disposto na CCT de referência.

Após esta terminologia genérica, em que não contempla o posto de Supervisor, seguimos com os cargos mais específicos da CCT onde há a citação do cargo de Supervisor:

"Parágrafo Primeiro - Terão pisos específicos os empregados dos seguintes segmentos:

(…) III) No segmento das empresas prestadoras de serviços de logística, nas instalações da prestadora ou nas instalações do tomador de serviço, compreendendo-se como segmento de “suply chain management”, gerenciamento da cadeia de suprimentos, planejamento, implementação, controle de fluxo e armazenamento de matérias primas, matérias semi acabadas, produtos e materiais semi acabados, bem como informações a eles relativas; (…)

f) R$ 1.908,11: Supervisor e Motorista de Caminhão. (frisos nossos)

IV) Especializados no segmento de Concessionárias de Energia Elétrica, Água, Saneamento básico e Similares, Gás e Similares, bem como os empregados administrativos e internos, inclusive as privatizadas mediante concessão do setor público no Estado do Rio de Janeiro. (…)

f) R$ 2.228,66: Supervisor ". (frisos nossos)

Resumindo, pelo meu entendimento, há 2 cargos de supervisores nesta CCT: um é o de Supervisor de Almoxarifado e o outro de Supervisor de Concessionária de Serviços Públicos. Não há algo como Supervisor Administrativo ou Supervisor de Escriturários e, obviamente, quem está se utilizando desta CCT, ainda aplicou o piso da alínea f do item III, que é o cargo de Supervisor com o piso mais baixo.

Estou aqui disponibilizando os links referentes às CCTs:

RJ000713/2021: http://www.febrac.org.br/v1/images/CCTS/RJ000713.2021.pdf

RJ001053/2021: https://fenaserhtt.com.br/wp-content/uploads/2021/05/CCT-RJ-Capital-2021.2022.pdf

Depois deste longo texto, em que já peço desculpas pela minha prolixidade, meus questionamentos são:

  1. Pelo pouco que conheço, a licitante tem de ter vínculo com a CCT utilizada, o que se daria verificando o código CNAE previsto na Atividade Principal do extrato de CNPJ da RFB, ou há outra maneira de se averiguar?

  2. Em um pregão com 2 itens afins, no nosso caso, os cargos de Escriturário e Supervisor dos Escriturários, poderão ser utilizadas 2 CCTs diferentes, uma para cada posto?

  3. Caso a licitante se utilize de uma CCT diferente da que utilizamos como referência, ela poderá se utilizar de um posto similar para compor o salário? Explicando melhor, no nosso caso, ela poderá se utilizar do posto “demais funções administrativas” no lugar do posto de Escriturários, e do cargo de Supervisor de Almoxarifado ou o de Supervisor de Concessionária de Serviços Públicos no lugar do de Supervisor de Escriturários?

Agradeço de antemão pela ajuda de todos! Muito obrigado!

Atenciosamente,

Gustav A. Engmann.

Creio que a resposta pode ser encontrada neste tópico existente:
https://gestgov.discourse.group/t/qual-cct-aceitar-na-proposta/1745/39

Boa tarde, Jassbru!

Primeiramente, obrigado pela resposta! Eu acompanhei essa discussão antes de postar aqui, mas não encontrei muita similaridade com minhas dúvidas, principalmente em relação aos itens 2 e 3 q postei. Em relação ao item 2, não sei se me expliquei bem. Quando escrevi “poderão ser utilizadas 2 CCTs diferentes, uma para cada posto?”, eu quis dizer no mesmo pregão, para o mesmo contrato, afinal, é um grupo com 2 itens, para escriturário e supervisor. É pergunta de leigo mesmo! Mas agradeço bastante pela resposta!

Att, Gustav.

Gustavo, tentando contribuir, lanço meus comentários:

1. Pelo pouco que conheço, a licitante tem de ter vínculo com a CCT utilizada, o que se daria verificando o código CNAE previsto na Atividade Principal do extrato de CNPJ da RFB, ou há outra maneira de se averiguar?
O enquadramento sindical do empregador se dá pela atividade preponderante. Como definir essa tal atividade não parece uma questão simples.
No PARECER n. 00005/2020/CPLC/DEPCONSU/PGF/AGU, a CÂMARA PERMANENTE DE LICITAÇÕES E CONTRATOS ADMINISTRATIVOS - CPLC da AGU chegou à conclusão que vale a atividade “que caracterizar a unidade do produto, operação ou objetivo final, para cuja obtenção todas as demais atividades convirjam, exclusivamente, em regime de conexão funcional (art. 581, § 2º, da CLT)”.
Eu não entendo claramente o que isso significa, na prática. O mesmo parecer, em outro momento, fala em proporção do faturamento da empresa, dando a entender que esse pode ser um critério relevante de análise.
Há quem defenda que a atividade preponderante é aquela que gera maior receita operacional para o estabelecimento. Um conceito, convenhamos, de difícil avaliação.
Se usarmos como referência os entendiemntos da Receita Federal, para fins de enquadramento em Riscos Ambientais do Trabalho (GILRAT), o critério não leva em conta o CNAE, mas a atividade que ocupa, em cada estabelecimento da empresa (matriz ou filial), o maior número de segurados empregados e trabalhadores avulsos.Vide, por exemplo, a Solução Cosit n. 28/2020, em http://normas.receita.fazenda.gov.br/sijut2consulta/anexoOutros.action?idArquivoBinario=56064
Há quem defenda, ainda, em alguns casos, não é possível definir atividade preponderante porque, exercendo diversas atividades, sem conexão funcional, cada uma das atividades deve ser tratada de modo diverso. Veja, sobre isso, esse texto: https://www.ozai.com.br/como-realizar-o-enquadramento-sindical/

Enfim, o que fazer?

Minha sugestão é deixar BEM CLARO que a responsabilidade e todas as consequências do enquadramento sindical adequado são exclusivamente vinculados à decisão da empresa licitante.

No excelente artigo “CONTRATAÇÃO DE SERVIÇOS COM DEDICAÇÃO EXCLUSIVA DE MÃO DE OBRA: A PROBLEMÁTICA DO ENQUADRAMENTO SINDICAL E SEUS IMPACTOS NA LICITAÇÃO”, Victor Amorim dá uma aula sobre o tema e explica que "a Administração não possui ingerência sobre a norma coletiva de trabalho que deverá ou não ser observada por um contratado para a prestação de serviços terceirizados". Segue o autor:

o enquadramento sindical na esfera exclusiva de avaliação da empresa, não teria a Administração
condições de aferir o acerto ou o desacerto da indicação da CCT mais adequada ao objeto do contrato
em questão, de modo que, em caso de qualquer controvérsia relativa à correta aplicação de norma coletiva,
competirá à Justiça do Trabalho dirimi-las nos termos do art. 625 da CLT

Victor Amorim recomenda que os editais tragam orientações explícitas sobre o tema, exemplificando com a redação adotada por editais de licitação do Senado Federal:

É de responsabilidade da licitante a indicação do ACT/CCT tendo em vista seu enquadramento sindical
(art. 511, § 2º, da CLT) ou, em caso de vinculação sindical plúrima do empregador terceirizante (art. 581, §1º, CLT),
norma coletiva de trabalho (ACT/CCT) que envolva os segmentos profissionais cujas atividades estejam
contempladas no objeto da licitação.

São obrigações da CONTRATADA, além de outras previstas neste contrato ou decorrentes da natureza do ajuste:

"XXX - responsabilizar-se pelos ônus financeiros e acréscimos substanciais de custos em face de alteração superveniente
de ACT/CCT vinculada a proposta da CONTRATADA em decorrência de decisão judicial ou de fato que afete o seu
enquadramento sindical ou a sua vinculação a instrumento coletivo de trabalho no qual a empresa tenha sido
representada por órgão de classe de sua categoria."

Nesse artigo, Victor Amorim ainda trouxe o conceito de que “terceirização” não constitui uma atividade econômica propriamente dita para fins de vinculação a determinado sindicato patronal, havendo, nesse caso, uma espécie de “vinculação sindical plúrima do empregador terceirizante”, aplicando-se aos contratos de trabalho que celebra as normas coletivas próprias a cada qual desses segmentos econômicos e profissionais. Recomendo a leitura do artigo.

2. Em um pregão com 2 itens afins, no nosso caso, os cargos de Escriturário e Supervisor dos Escriturários, poderão ser utilizadas 2 CCTs diferentes, uma para cada posto?
Depende. São categorias diferenciadas? Existe alguma lei que regulamente essas profissões? Estariam abrangidas pela lei da profissão contábil?
Se a resposta for positiva, ou seja, se são categorias diferenciadas, então os empregados podem ter direito a observância da CCT específica da categoria, válida no local de prestação do serviço, mas apenas se a categoria econômica da empresa empregadora (licitante) foi representada na negociação coletiva.
Caso não sejam categorias diferenciadas ou não tenham direito ao instrumento coletivo diferenciado, então valem outras regras. E outras hipóteses.

A primeira hipótese é que a empresa deve respeitar os direitos mínimos definidos no instrumento coletivo (para simplificar, chamaremos de CCT, sabendo que existem outros, como ACT e Dissídio). O mais básico desses direitos é o piso salarial.

Se não existe piso salarial específico para o cargo na CCT da atividade preponderante da empresa, então a única obrigação é com o piso genérico, se existir. Do contrário, vale o piso do salário mínimo aplicável (há estados com valores diferentes do nacional).

Ora, se a empresa só está obrigada a seguir o piso, PODE escolher outro patamar salarial, desde que MAIOR que o piso. É uma escolha da empresa.

Veja que um risco para a empresa é decidir pagar um salário muito baixo, mesmo que legalmente possível, e não conseguir contratar alguém que preencha os requisitos mínimos para a função.

Uma grande dúvida que tenho, para a qual ando em busca de solução faz tempo, é como fica a repactuação nesses casos, em que a empresa ESCOLHEU pagar uma remuneração MAIOR que o piso a que estava obrigada, usando como referência, por opção, outra CCT, diferente daquela a que estaria vinculada obrigatoriamente. Se alguém tiver pistas sobre como tratar disso, ficarei feliz em construir um entendimento coletivo.

3. Caso a licitante se utilize de uma CCT diferente da que utilizamos como referência, ela poderá se utilizar de um posto similar para compor o salário? Explicando melhor, no nosso caso, ela poderá se utilizar do posto “demais funções administrativas” no lugar do posto de Escriturários, e do cargo de Supervisor de Almoxarifado ou o de Supervisor de Concessionária de Serviços Públicos no lugar do de Supervisor de Escriturários?

Baseado no comentário anterior, eu diria que sim, reforçando, desde que esses cargos não sejam diferenciados ou não tenham direito à CCT diferenciada, a empresa DEVE respeitar o piso aplicável da CCT da atividade preponderante.

Para mim está razoavelmente claro que ambos os cargos se enquadram em “demais funções administrativas”, por não existir, segundo seu relato, os cargos específicos na CCT. Nada impede que a empresa decida pagar um salário maior para o Supervisor, o que faz todo sentido e pode evitar reclamações trabalhistas futuras por equiparação salarial. Nesse caso, a empresa pode usar, como referência, o cargo previsto na CCT com maior similaridade às funções do Supervisor Escriturário, mas não é obrigada, em tese, a seguir esse piso, pois as funções não são necessariamente idênticas.

Espero ter contribuído.

Franklin Brasil
Autor de Como Combater o Desperdício no Setor Público

Autor de Como Combater a Corrupção em Licitações

Autor de Preço de referência em compras públicas

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Muito obrigado, Mestre Franklin Brasil! Foram muito mais que respostas, foi uma aula de excelência!

Mestre Franklin, sobre esta questão, pela experiência que tenho como licitante, posso afirmar que a maioria das convenções coletivas trazem uma cláusula com o percentual de reajuste global. Por exemplo, eles consignam expressamente qual foi o percentual de aumento da base salarial e dos benefícios (ex: percentual de reajuste de 8% - o salário era R$ 2.000,00 e passou a ser R$ 2.160,00; o VA era de R$ 30,00 por dia e passou a ser de R$ 32,40) e ao final registram qual foi o percentual utilizado para reajuste (neste meu exemplo, 8%). Assim fica fácil…

Se a empresa estabelecer um salário acima do piso genérico a que está obrigada pela CCT, seria então simplesmente aplicar o percentual global de reajuste que vem na CCT para este salário “inventado”, na ocasião da repactuação. Qual a sua opinião?

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É uma hipótese plausivel, @Alok. Tem uma lógica bem defensável. Se a CCT a que a empresa estiver obrigada definir aumento genérico mínimo, me parece resolver a parada. Ela estaria obrigada a aumentar, naquele percentual, o salário do empregado, ainda que o salário seja superior ao piso.

Mas creio que persiste minha inquietação nos casos - talvez seam raros, não tenho elementos para avaliar com clareza - em que a CCT não trouxer, expressamente, um percentual de aumento genérico para os cargos não especificados.

Admito que minha dúvida tem mais a ver com o Direito Trabalhista - com o qual tenho tentado conviver pacificamente nos últimos anos, a duras penas - e gostaria de mais respaldo normativo ou jurisprudencial para entender como funcionam as obrigações dos empregadores quando contratam empregados com salários superiores ao piso (ou quando não existe piso definido).

Obrigado por desenterrar o tópico, @Alok!

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