Qualificação econômico - financeira - dois últimos exercícios

Bom dia a todos!
Gostaria de ajuda dos senhores em relação a seguinte situação. Em análise de um edital de concorrência, ocorre a seguinte solicitação em relação á qualificação econômico-financeira:

“14.2. Para a qualificação econômico-financeira, requer-se:
I – certidão negativa de efeitos de falência, recuperação judicial ou recuperação extrajudicial expedida pelo distribuidor da sede da licitante;
II – balanço patrimonial com as demonstrações contábeis dos dois últimos exercícios
sociais devidamente registrado na junta comercial do estado da sede da proponente,
já exigíveis na data da abertura do certame e apresentados na forma da lei,
devendo comprovar:
a) patrimônio líquido de no mínimo 10% (dez por cento) do valor total estimado para a contratação;
b) índice de liquidez corrente (ILC) superior a 1,00, calculado pela fórmula: ILC = AC/ PC
c) índice de liquidez geral (ILG) superior a 1,00, calculado pela fórmula:
ILG = AC + ARLP / PC + PELP
d) Capital Circulante Líquido ou Capital de Giro (Ativo Circulante – Passivo Circulante) de, no mínimo, duas vezes a parcela média mensal do valor estimado da contratação, acrescido do Capital Circulante Líquido Acumulado apresentado no inciso III, tendo por base o balanço patrimonial e as demonstrações contábeis do último exercício social e calculado pela fórmula:
CCL ≥ 2 x (Valor Estimado / Prazo em meses) + CCL
comprometido acumulado (inciso III)
CCL ≥ 2 x + (R$ 0000 / 24) = R$ 0000 + CCL comprometido acumulado (inciso III)”

Minha dúvida é: Como serão levados em consideração os balanços dos dois últimos exercícios? Serão analisados isoladamente, onde cada um deve separadamente atender aos requisitos? Será considerado apenas o último exercício social, da mesma forma que no item d)?
Agradeço desde já a todos.

Acredito que sua dúvida deva ser objeto de pedido de esclarecimentos ao órgão promovedor da concorrência. Não sei qual é o objeto, mas me parecem exigências um tanto exageradas.

Você deve pedir esclarecimento ao órgão sobre isso.

Se não for prestada nenhuma informação complementar, pelo que está previsto no edital as letras “a”, “b” e “c” do II deverão ser comprovados em relação aos dois últimos exercícios. Assim, para cada um dos exercícios precisarão ser satisfeitas as condições. Já especificamente para a letra “d” há a previsão expressa de que a comprovação se dará somente em relação ao último exercício, diferente da regra geral do II para as demais letras.

Ao pedir o esclarecimento vão detalhar se de fato há justificativa técnica para essa diferenciação ou se foi um “copia e cola” que acabou misturando possibilidades da NLLC (dois últimos exercícios) com exigências já utilizadas anteriormente (CCL do último exercício).

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Bom dia colegas Preciso da opinião de vocês acerca de um assunto. Estamos realizando um pregão eletrônico para contratação de serviço de fornecimento de preparo e distribuição de refeições, na modalidade prato feito, com concessão onerosa de espaço. No momento, estamos na fase recursal. A recorrente alega que a primeira colocada não apresentou os indices de qualificação econômico-financeiros exigidos pelo edital. Ocorre que a recorrida apresentou somente os de 2022. Como o Edital e a lei 14.133 exige a apresentação do balanço e demonstração do resultado dos dois últimos exercícios, penso eu que a empresa deve apresentar também os índices referentes aos dois últimos anos, mediante declaração assinada por profissional da área contábil, conforme é previsto no edital. Estou correto? Outra coisa: Neste caso, o pregoeiro ou a equipe técnica pode sanar essa questão? A empresa disponibilzou as demonstrações contábeis e podemos perfeitamente calcular os índices e verificar se a mesma atende.

O edital traz os seguintes itens:
8.25. Balanço patrimonial, demonstração de resultado de exercício e demais demonstrações contábeis dos 2 (dois) últimos exercícios sociais, comprovando:
8.25.1. Índices de Liquidez Geral (LG), Liquidez Corrente (LC), e Solvência
Geral (SG) superiores a 1 (um);

8.28. O atendimento dos índices econômicos previstos neste item deverá ser atestado mediante declaração assinada por profissional habilitado da área contábil, apresentada pelo fornecedor.

A meu ver, as resposta são “sim” e “sim”.

Sim, os índices, no seu edital, estão sendo exigidos em relação aos dois exercícios anteriores, e não apenas em relação ao último.

E sim, em tese se há elementos no processo vocês mesmos podem calcular os índices para sanar a falha, e terá a mesma validade jurídica para a habilitação. Formalismo moderado: a essência da exigência é comprovação da saúde financeira por meio dos índices, e não o envio da declaração.

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Essa questão dois 2 exercícios anteriores ainda está muito nebulosa. Estou esperando ansioso a jurisprudência se debruçar sobre a matéria. Me parece pouco razoável exigir os índices mínimos nos 2 exercícios. Essa exigência só faz sentido para o último exercício, que releva a situação consolidada mais recente.

Escrevi sobre isso na 4a edição do livro Como Combater a Corrupção em Licitações:

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Claro que jurisprudência a respeito será bem vinda e esclarecedora. Enquanto não vem, podemos “divagar” a respeito. E nessa linha peço licença para cordial e respeitosamente discordar em parte do nosso ilustre professor @FranklinBrasil.

Embora não seja da área contábil, mas tendo algum grau de conhecimento, creio que a abertura feita na lei para exigência dos documentos contábeis dos dois últimos exercícios tem certa lógica, a depender do objeto. Vejo similaridade entre essa exigência e aquela de caráter técnico para serviços continuados referente a experiência pretérita mínima de até 3 anos. Se é necessário exigir experiência no ramo por pelo menos 3 anos, também pode ser necessário verificar que nesses anos ela tenha feito isso com razoável saúde financeira pelo menos nos últimos 2 anos.

Como a qualificação econômico-financeira se presta a verificar a saúde financeira das potenciais contratadas, uma análise de mais de um exercício permite uma eventual avaliação mais sólida e também evita maquiagens contábeis. Evita, por exemplo, que uma empresa infle artificialmente ativo circulante em contrapartida a passivos não circulantes, o que melhora o ILC e CCL, por exemplo. Analisando não apenas o último exercício como também o anterior tem-se maior segurança na análise da saúde financeira, além de fornecer maior confiabilidade nos dados de longo prazo. E talvez tenha sido esse um dos fundamentos de se pedir além do último exercício: verificar a consistência do que é circulante e do que é não circulante, tanto em relação ao ativo quanto ao passivo.

Caso não fosse devido exigir índices dos dois últimos exercícios, então qual função exatamente a lei teria reservado à exigência de documentação contábil de exercício que não o último?

Isso leva a outro ponto que, na minha opinião, seria de grande potencial evolutivo para seleção de bons prestadores de serviços principalmente: melhorar qualitativamente o que se exige de comprovação para fins de qualificação econômico-financeira. Especialistas e técnicos da área contábil, conhecedores e praticantes dos CPCs, podem fornecer contribuições maravilhosas no que diz respeito ao que poderia ser exigido. Os 3 índices atualmente consolidados não são os únicos “coeficientes e índices econômicos” que são “usualmente adotados para a avaliação de situação econômico-financeira”. Um exemplo dessa evolução que de fato aconteceu foi a exigência de CCL mínimo de 16,66% do valor estimado para contratações de serviços continuados com DEMO, uma inovação normativa com base em estudo técnico que demonstrou a necessidade desse mínimo de CCL para fazer frente aos custos iniciais de uma contratação dessa natureza. As únicas vedações que existem para isso são: não podem ser índices não usuais (inventados), e também entre os usuais não podem ser de rentabilidade ou lucratividade. A lei permite inclusive a exigência de “demais demonstrações contábeis” para essa análise, não somente o BP e a DRE. Para mim é impossível que, fora essas vedações, somente restem aqueles 3 sempre utilizados (mesmo sem qualquer justificativa) e o CCL nas prestações com regime de DEMO.

Para essa evolução são necessários dois importantes passos: elencar novos índices e coeficientes, usualmente adotados na área contábil, que se prestem a avaliar a saúde financeira de uma empresa, a depender do ramo; e em cada processo conseguir justificar a adoção desses índices de acordo com o objeto e ramo da atividade.

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Bom debate, @alex.zolet

Discordar é fundamental para tentarmos avançar.

Aproveito para relembrar o que já postei sobre a utilidade efetiva de índices contábeis isolados, que escrevi nesse post

Uma discussão relevante é a validade efetiva dos índices contábeis na mitigação de
riscos para o contratante. Felipe Boselli (2010b), por exemplo, defende que regimes tributários diferentes podem impactar fortemente os índices, sem, necessariamente, afetar a capacidade da empresa de atender o contrato. O autor alerta, de forma acertada, que o uso isolado dos índices contábeis deve ser acompanhado de análise criteriosa, sob pena de não representar indicador efetivo de solvência da licitante analisada
(…)
Continuando esse debate, num exercício hipotético, imagine uma empresa que acabou de ser criada. Pode não ter muito dinheiro em caixa, talvez tenha um Ativo de apenas R$1,00. Mas também não tem dívidas, de modo que seu Passivo é zero ou próximo disso. Em nosso exemplo, digamos que seja R$0,50. O índice de Liquidez Corrente dessa empresa será 2. Para cada real que ela deve, tem dois em caixa. Olhando apenas para o índice, sua capacidade econômica poderia ser confundida com uma situação bastante confortável. Mas, convenhamos, você contrataria esse fornecedor para uma obra ou qualquer ajuste que exija condições financeiras para cumprir as obrigações?
(…)
Fórmulas simplistas e genéricas de índices contábeis, iguais para toda e qualquer empresa, modalidade ou objeto, acreditando que isso demonstra “boa saúde financeira”, pode não representar a melhor forma de gerenciar os riscos

Espero ter contribuído.

Franklin Brasil

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É exatamente esse ponto: não tem como pedir algo pra tudo. E a análise da saúde financeira deveria ser quase uma “mini auditoria contábil”. Vou dar um exemplo real:

Em uma licitação para contratação de serviços em regime de DEMO, a empresa “A” teve a proposta de menor preço. Foi exigido ILG, ILC e ISG maiores que 1 e CCL (AC - PC) mínimo de 16,66% do valor estimado (só o básico, sem maiores fundamentações). Ela atendeu a todos. Onde estava o problema? Na análise criteriosa da documentação contábil apresentada (somente Balanço Patrimonial e Demonstração do Resultado do Exercício).

Essa empresa “A” estava em recuperação judicial. Até aí nenhum problema por si só. Ela não era ME nem EPP, então tinha porte maior. Acontece que mais de 70% da composição do Ativo Circulante (AC) dela era de direitos em relação a “coligadas e controladas” (a grosso modo seria o dinheiro a receber, no curso prazo, dessas coligadas e controladas). E a contrapartida desses direitos de curto prazo, para com essas coligadas e controladas, eram obrigações que não eram de curto prazo (inscritas no passivo não circulante). Com um AC alto, teve índices satisfatórios, conseguiu ter o ILC (AC/PC) mínimo, e bom CCL. Ao se avaliar essas coligadas e controladas, num total de 4, TODAS estavam também em recuperação judicial.

Aí a pergunta: os créditos relativos a empresas em recuperação judicial não deveriam possuir uma “provisão” (sei da inadequabilidade do termo) para perda desses créditos das coligadas e controladas por estarem em recuperação judicial? Se esses créditos fossem considerados contabilmente como de “liquidação duvidosa”, e feita a provisão para a perda, o AC seria drasticamente reduzido e, em consequência, não atingiria os mínimos exigidos na licitação, tanto de ILC quanto do CCL.

Dou esse exemplo para ratificar o entendimento de que as exigências de qualificação econômico-financeira, assim como as demais, devem ser estudadas e fundamentadas, exigidas de acordo com a contratação, para refletirem a medida necessária para atendimento da demanda da Administração. Não tem fórmula mágica, nem índices ou coeficientes absolutos, inquestionáveis. E por isso a grande margem de crescimento no refinamento das exigências dessa natureza.

Bom apontamento, @alex.zolet

Para isso (em tese) serve a exigência das demonstrações contábeis, para verificar coerência.

Lembrei de um caso que o TJBA considerou fraude, que teria sido comprovada pela perícia contábil. O Poder Judiciário reconheceu que a fraude foi fundamental para a habilitação.

O balanço patrimonial apresentava no Ativo Circulante a conta “Transações com Partes Relacionadas”, com saldo de R$ 1 milhão. A classificação correta seria no Ativo Realizável a Longo Prazo, segundo o art. 179, II, da Lei nº 6.404/1976:

“Art. 179. … II - no ativo realizável a longo prazo: os direitos … derivados de … adiantamentos ou empréstimos a sociedades coligadas ou controladas, diretores, acionistas ou participantes no lucro da companhia…”

Subtraindo do Ativo Circulante a conta “Transações Com Partes Relacionadas”, o índice de liquidez corrente seria menor que ‘1’, deixando de atender à regra do Edital.

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