Olá Cecília e Priscila, escrevi algo a respeito do assunto em curso de Contratações Diretas da ESMPU. Encaminho abaixo pois acredito que pode ser útil no que tange aos questionamentos colocados.
Compreendida a diferença entre
parcelamento e fracionamento (parcelamento indevido), outra questão que se
coloca é “o que caracterizaria o fracionamento da despesa? ” Apesar da redação
legal se referir em certo ponto a “serviços de mesma natureza” para delimitar o
conceito de fracionamento indevido, percebe-se, nesse ponto, a inexistência de
critérios absolutos consagrados como infalíveis para se evitar a caracterização
do parcelamento indevido. A fim de mitigar os riscos e conceder ao
Administrador o mínimo de segurança jurídica para decidir, alguns caminhos têm
sido indicados, conforme se expõe a seguir.
No Acórdão nº 1276-08 - Plenário, o
TCU, ao tratar de despesas realizadas com suprimento de fundos, ressaltou que a utilização de suprimento de fundos para
aquisição, por uma mesma unidade gestora, de bens ou serviços mediante diversas
compras em um único exercício e para
idêntico subelemento de despesa, cujo valor total supere os limites dos
incisos I ou II do art. 24 da Lei nº 8.666/1993, constitui fracionamento de despesa, situação vedada pelos referidos
dispositivos legais. Apesar do posicionamento destacado, mais a frente, o
Tribunal evoluiu o entendimento para não delimitar apenas ao subelemento de
despesa a caracterização do fracionamento indevido. Nesse sentido, confira-se:
…a
Semag reconhece a validade dos argumentos trazidos pela STN, os quais justificariam
a alteração pretendida por aquele órgão, no sentido de que a caracterização do fracionamento ilegal se dê pela aquisição de bens
ou serviços de mesma natureza, e não pela aquisição de bens ou serviços
classificados em idêntico subelemento de despesa. 10. Realmente, trata-se de
inexatidão técnica que reclama correção por parte do Tribunal, consoante
sugerido pela unidade instrutiva. (Acórdão nº 2.557/09 – Plenário TCU)
…e fato, não
há como se concluir que a classificação das despesas segundo a legislação
contábil/orçamentária (norma geral) é que nortearia a definição da modalidade
de licitação ou do caso de dispensa de certame da espécie para as contratações
com a administração. Até porque a Lei nº 8.666/1993 é a norma especial que
rege os procedimentos de licitações e contratos para o setor público. E
conforme elementar princípio de hermenêutica, havendo conflito entre uma norma
especial e outra geral, aquela prevalece sobre esta última. (Acórdão nº
2.557/09 – Plenário TCU)
Em
outras decisões, a Corte de Contas também deixou assentado que não se deveria entender como objetos de
mesma natureza o item a ser adquirido pela Administração, contemplando
assim a possibilidade de se gastar, por exemplo, R$ 8.000,00 com lápis, igual
montante com caneta e assim sucessivamente[1],
bem como que a Administração deveria
evitar a aquisição fracionada de bens ou
serviços prestados em uma mesma localidade[2],
ou ainda que, mesmo que com rubricas
orçamentárias distintas, evitasse a contratação do mesmo fornecedor para
diversos serviços, de modo a ultrapassar os limites da dispensa de licitação
por valor[3].
Em
síntese, verificamos que não há um fator isoladamente considerado que possa
caracterizar o fracionamento de despesa, sendo identificada essa sob um prisma
conjuntural da contratação que está sendo realizada. Nesse sentido, uma análise
adequada da existência de fracionamento deverá levar em conta, pelo menos, (i) objetos semelhantes ou de mesma natureza,
assim entendidos aqueles passíveis de serem agrupados ante a sua similaridade
de gênero[4] (ii) fornecidos num mesmo contexto de mercado (local, regional ou nacional e
ainda por fornecedor especializado[5]),
(iii) no mesmo exercício financeiro
e (iv) que não denotem falta de
planejamento, ao dispensar a licitação para objetos já licitados no exercício,
por exemplo.
Em
esclarecedor posicionamento sobre o tema, a AUDIN, órgão de auditoria do
Ministério Público, assim sintetizou o entendimento atual aplicável aos órgãos
sob sua jurisdição:
Ante o exposto, segundo as disposições da Lei nº
8.666/93 e da Jurisprudência do TCU acima referidos, somos de parecer que:
a) O subelemento de despesa é apenas um importante
indicativo, não sendo um critério absoluto para definição de objetos de mesma
natureza;
b) a expressão “mesmo local” constante do
inciso I do art. 24 da Lei nº 8.666/93, refere-se a uma região geoeconômica, ou
seja, a área de atuação profissional, comercial ou empresarial dos possíveis
fornecedores ou prestadores de serviço a serem contratados pela Administração,
podendo, a depender do caso concreto, referir-se a um município.
c) a expressão “mesmo local” também pode
ser aplicada para a aquisição de bens, considerando que a regra é somar tudo
aquilo que puder ser objeto de uma só compra de maior vulto, desde que não haja
prejuízo para a Administração, em termos técnicos ou econômicos;
d) atingido o limite para dispensa de licitação,
estabelecido no inc. II do art. 24 da Lei nº 8.666/93, de despesa
comprovadamente planejada e estimada para compra direta, eventual nova
aquisição de bens de mesma natureza deverá ser efetivada, em regra, mediante
licitação;
e) se o valor de uma despesa for adequadamente
planejado e estimado, sob os aspectos qualitativo e quantitativo, para
aplicação de determinada modalidade de licitação, configura-se fracionamento
indevido a efetivação de nova aquisição de objeto de mesma natureza por meio de
dispensa de licitação.[6]