Inabilitação por Documento(simplezinho) Faltante

Santiago,

Seu caso me parece se encaixar na lógica do formalismo moderado, que temos tratado aqui no Nelca desde a sua criação em 2009.

Sobre o tema, cito Odete Medauar (Direito administrativo moderno. 9.ed., 2005):

“Exemplo de formalismo exacerbado, destoante deste princípio [do formalismo moderado], encontra-se no processo licitatório, ao se inabilitarem ou desclassificarem participantes por lapsos em documentos não essenciais, passíveis de serem supridos ou esclarecidos em diligências”

Para a autora, portanto, com quem concordo, se um documento é apresentado com falha sanável é possível aceitar, em nome da razoabilidade e da busca pela proposta mais vantajosa.

Veja esse caso muito similar ao seu, julgado pelo TRF-4, no processo nº 5026749-10.2016.4.04.7000/PR:

REMESSA NECESSÁRIA. DIREITO ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. LEI Nº 8.666/93. DECLARAÇÃO APÓCRIFA. MERA IRREGULARIDADE. VÍCIO SANÁVEL. PRECEDENTES.

Na hipótese, a falta de assinatura em um documento regularmente apresentado é mera irregularidade, ainda mais quando o edital prevê a possibilidade de saneamento;

O artigo 43, parágrafo 3º, da Lei nº 8.666/93 faculta à Administração efetuar diligência destinada a esclarecer ou a complementar a instrução do processo em qualquer fase da licitação, inclusive com a concessão de prazo para sanar o defeito na documentação, visando ao interesse público em detrimento de um formalismo exacerbado.

Considerando que a representante legal da pessoa jurídica estava presente na sessão de abertura dos envelopes de habilitação (evento 1, ATA5), podendo, pois, ratificar o conteúdo daquela declaração, não me parece razoável interpretar restritivamente a faculdade contida no item ‘12.12’ do edital.

Não se trata de alteração substancial de informações ou propostas, mas tão somente da falta de assinatura em um documento - assinatura esta que, muito provavelmente, poderia ser aposta pela representante da impetrante que esteve presente à sessão.

Nesse sentido, já se decidiu:

“ADMINISTRATIVO. LICITAÇÃO. FALTA DE RECONHECIMENTO DE FIRMA EM CERTAME LICITATÓRIO. MERA IRREGULARIDADE. 1. Trata-se de documentação - requisito de qualificação técnica da empresa licitante - apresentada sem a assinatura do responsável. Alega a recorrente (empresa licitante não vencedora) a violação ao princípio de vinculação ao edital, em razão da falta de assinatura na declaração de submissão às condições da tomada de preços e idoneidade para licitar ou contratar com a Administração. 2. É fato incontroverso que o instrumento convocatório vincula o proponente e que este não pode se eximir de estar conforme as exigências apresentadas no Edital. Devem estar em conformidade com o documento administrativo, tanto a qualificação técnica, como a jurídica e a econômica-financeira. 3. Porém, há de se reconhecer que, a falta de assinatura reconhecida em um documento regularmente apresentado é mera irregularidade - principalmente se o responsável pela assinatura está presente no ato para sanar tal irregularidade. Precedente. 4. Recurso especial não provido.” (destaquei)

(RESP 200701008879, MAURO CAMPBELL MARQUES, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:06/10/2010 …DTPB:.)

Citando o TCU:

Acórdão 1758/2003 – Plenário
Ressalto, preliminarmente, que o edital não constitui um fim em si mesmo. Trata-se de instrumento para a consecução das finalidades do certame licitatório, que são assegurar a contratação da proposta mais vantajosa e a igualdade de oportunidade de participação dos interessados, nos precisos termos do art. 3º, caput, da Lei 8.666/93.
Assim, a interpretação e aplicação das regras nele estabelecidas deve sempre ter por norte o atingimento das finalidades da licitação, evitando-se o apego a formalismos exagerados, irrelevantes ou desarrazoados, que não contribuem para esse desiderato.

Outros julgados sobre o excesso de formalismo:

TJ-MA. REMESSA N.º 001168/2010 – SÃO LUÍS. REEXAME NECESSÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. LICITAÇÃO. CONCORRÊNCIA CONJUNTA. CONTRATO SOCIAL COM ALGUMAS FOLHAS SEM AUTENTICAÇÃO. INABILITAÇÃO. EXCESSO DE FORMALISMO. SEGURANÇA CONCEDIDA. NÃO PROVIMENTO.

I – Em observância ao princípio da razoabilidade e em prol do interesse público de que a licitação possua o maior número possível de participantes para que a escolha final recaia sobre a proposta mais vantajosa, não é admissível a rejeição de interessados por meras omissões e defeitos irrelevantes, incapazes de trazer prejuízo à Administração ou licitantes;

TJ-MA. MANDADO DE SEGURANÇA Nº 011376/2009.

A Administração Pública não deve agir com exacerbado formalismo, inabilitando licitantes ou desclassificando propostas, acaso as irregularidades constatadas na documentação não lhe acarretem qualquer prejuízo, pois o fim eminente típico de uma licitação é permitir a escolha da proposta mais vantajosa, dentre aquelas apresentadas por uma maior gama de interessados. Vale dizer que com quanto mais participantes o certame contar, maior será a possibilidade de encontrar preços competitivos, no entanto, devem ser resguardos os casos que possam trazer algum prejuízo ao erário público.

TRF 5ª REGIÃO. APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 89278/SE (2004.85.00.001696-0).

  1. O Pregão trata-se de modalidade de licitação que prima pela celeridade (tanto que sua fase externa é realizada em uma única sessão pública), sem olvidar da observância dos princípios da isonomia, da legalidade e da busca de melhor proposta para a Administração. Diferentemente do que sucede em outras modalidades, nesta primeiramente se classificam as propostas e somente após se analisa a regularidade documental do licitante responsável pela proposta vencedora, para avaliar-se sua habilitação.
  1. Em regra, não permite a Lei n.º 10.520/2002 ou o Decreto que regulamenta o Pregão, de n.º 3.555/2000, qualquer dilação de prazo para apresentação ulterior de documento pertinente à habilitação da empresa. Se a sua proposta saiu-se vencedora, mas há motivo para que ela não seja habilitada, passa-se à análise da habilitação daquela responsável pela segunda proposta mais vantajosa.
  1. Na hipótese, contudo, ao invés de a licitante vencedora juntar no envelope de habilitação (I) a certidão de registro da empresa e (II) o comprovante de sua quitação junto ao Conselho Regional de Administração de Sergipe, como exigido no item 7.2.2.2 do Edital n.º 01/2004, somente acostou aquele primeiro documento, sendo-lhe dado prazo de 24h úteis (portanto inábil a se providenciar o documento se ele ainda não existisse), com a anuência de todos os demais licitantes (logo em ofensa à isonomia), para apresentação do faltante, prazo esse fielmente obedecido. Decretar-se a nulidade da licitação em caso desse jaez é de apego excessivo à formalidade, em prejuízo da finalidade maior do certame, da busca de proposta mais vantajosa para a Administração.

STJ – 1ª SEÇÃO, MS 5418-DF, REL. MIN. DEMÓCRITO REINALDO, DJU 1.6.98, P. 24.

Consoante ensinam os juristas, o princípio da vinculação ao edital não é “absoluto”, de tal forma que impeça o judiciário de interpretar-lhe, buscando-lhe o sentido e a compreensão e escoimando-o de cláusulas desnecessárias ou que extrapolem os ditames da lei de regência e cujo excessivo rigor possa afastar, da concorrência, possíveis proponentes, ou que o transmude de um instrumento de defesa do interesse público em conjunto de regras prejudiciais ao que, com ele, objetiva a administração. […] o formalismo no procedimento licitatório não significa que se possa desclassificar propostas eivadas de simples omissões ou defeitos irrelevantes. segurança concedida.

STF – RMS 23.714/DF, rel. Min. Sepúlveda Pertence, j. em 05.09.2000, publicado no DJ de 13.10.2000, p. 21

Se a irregularidade praticada pela licitante vencedora, que não atendeu a formalidade prevista no edital licitatório, não lhe trouxe vantagem nem implicou prejuízo para os demais participantes, bem como se o vício apontado não interferiu no julgamento objetivo da proposta, não se vislumbrando ofensa aos demais princípios exigíveis na atuação da Administração Pública, correta é a adjudicação do objeto da licitação à licitante que ofereceu a proposta mais vantajosa, em prestígio do interesse público, escopo da atividade administrativa.

TJRS. Agravo de Instrumento Nº 70048264964, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Marco Aurélio Heinz, Julgado em 06/06/2012

AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. LIMINAR. LICITAÇÃO. PROPOSTA FINANCEIRA SEM ASSINATURA DE UM DOS SÓCIOS DA CONCORRENTE. DEFEITO SANÁVEL. PRESENÇA DOS REQUISITOS PARA A CONCESSÃO DO PROVIMENTO. A Administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada (art. 41 da Lei n. 8.666/93). Todavia, no caso, constitui mera irregularidade a falta de assinatura de um dos sócios na proposta financeira. Formalismo exagerado que conspira contra a presença de maior número de participantes no certame. Presença de relevante fundamentação e risco de ineficácia da medida, autorizando a concessão da liminar para que seja recebida e avaliada a proposta. Agravo provido.

De tudo isso, percebe-se que existem bons argumentos para fundamentar a aceitação de proposta mais vantajosa para a Administração, admitindo-se ajustes em erros formais, que não causem prejuízo.

Adotando essa linha de julgamento se estará prezando pelo princípio da eficiência e da economicidade.
Espero ter contribuído.

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