Faturamento de ME/EPP - Licitações

Pessoal, boa noite.
Como vocês estão lidando com a diferença do conceito de ME/EPP perante a LC 123 e a Nova Lei de Licitações? A receita bruta do ano anterior ou a regra do artigo 4°, §2° da Lei 14.133? § 2º A obtenção de benefícios a que se refere o caput deste artigo fica limitada às microempresas e às empresas de pequeno porte que, no ano-calendário de realização da licitação, ainda não tenham celebrado contratos com a Administração Pública cujos valores somados extrapolem a receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte, devendo o órgão ou entidade exigir do licitante declaração de observância desse limite na licitação.

Pelo conceito da LC 123, se uma empresa A ultrapassou no exercício anterior (entre 01/01 a 31/12) a receita bruta de R$4.800.000,00, ela deixa de ser EPP. Logo, não faria jus aos benefícios previstos na lei para as compras públicas. O próprio artigo 4°, caput, da Lei 14133 determina a observância da Art. 4º das disposições constantes dos arts. 42 a 49 da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006.

Há um aparente conflito nas regras acerca da condição de ME/EPP perante as licitações públicas, não?!

A princípio não há conflito. A regra é a receita bruta auferida no exercício anterior.

Ocorre que também há situações de desenquadramento caso haja “excesso” de receita no exercício corrente. E a o procedimento da NLLC é exatamente pra essa situação, pois se no exercício corrente, só em contratos públicos, a empresa já ultrapassou o limite, ela ja deveria ter comunicado à RFB e providenciado o desenquadramento.

Complementando a informação, a situação da Lei 14133/2021, a meu juízo, é apenas o detalhamento normativo de uma forma de caracterizar uma das situações, previstas no §4º do art. 3° da LC 123/2006, que excluem a empresa do tratamento diferenciado, mais especificamente o constante dos parágrafos 9° e 9°-A:

§ 9º A empresa de pequeno porte que, no ano-calendário, exceder o limite de receita bruta anual previsto no inciso II do caput deste artigo fica excluída, no mês subsequente à ocorrência do excesso, do tratamento jurídico diferenciado previsto nesta Lei Complementar, incluído o regime de que trata , para todos os efeitos legais, ressalvado o disposto nos §§ 9°-A, 10 e 12.

§ 9°-A. Os efeitos da exclusão prevista no § 9° dar-se-ão no ano-calendário subsequente se o excesso verificado em relação à receita bruta não for superior a 20% (vinte por cento) do limite referido no inciso II do caput.

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@Ivan_Pinna,

De fato, o parâmetro fixado na LCP 123 para fins de enquadramento das ME/EPP é baseado no faturamento, enquanto que a regra sobre aplicação ou não do tratamento favorecido e diferenciado para ME/EPP, previsto na Lei n° 14.133, de 2021, é baseada no valor estimado da licitação ou no volume de contratos assinados pela empresa.

São parâmetros realmente distintos. Mas observe que a matéria tratada nos artigos 42 a 49 da LCP 123 tem natureza de norma específica federal, não vinculante para outros entes federativos. Enquanto que o Art. 4° da Lei n° 14.133, de 2021, tem natureza de norma geral, vinculante para todos. Prevalece a norma geral de licitações nesse caso.

Professor, com a máxima vênia (é assim que o pessoal do direto costuma dizer? rsrsrs), mas não creio que a LC 123/2006 possua caráter de norma específica federal não vinculante a outros entes.

Isso por algumas razões, mas em especial pelo disposto logo no art. 1° da LC 123/2006:

Art. 1° Esta Lei Complementar estabelece normas gerais relativas ao tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, especialmente no que se refere:

(…)

III - ao acesso a crédito e ao mercado, inclusive quanto à preferência nas aquisições de bens e serviços pelos Poderes Públicos, à tecnologia, ao associativismo e às regras de inclusão. [sem grifos no original]

E os artigos 42 a 49, a meu ver, trazem exatamente o detalhamento dessa preferência nas aquisições de bens e contratações de serviços pelo Poder Público.

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Eu acredito que os dois critérios não são excludentes.
Receita bruta no ano-anterior, ultrapassou 4.800.000?? Desenquadra em 01/01 do ano seguinte.
Ultrapassou 20% do limite de 4.800.000,00?? O desenquadramento se dá no mesmo ano do exercício corrente, §12 e 13 do art. 3° da Lc123.
A Lei 14.133/2021 parece ter criado um novo tipo de desenquadramento, mas este se opera somente perante o regime de licitações e os benefícios de fomento às ME/EPP nas compras governamentais, que são os contratos com a Administração Pública cujos valores somados extrapolem a receita bruta máxima admitida para fins de enquadramento como empresa de pequeno porte.

Exemplo 1. Empresa A, possui receita bruta de 4.200.000 no ano-calendario anterior e 2.700.000 em contratos no ano anterior. Nao desenquadra de ME/EPP no ano seguinte.
Exemplo 2. Empresa B, possui receita superior a 5.760.000? 20% superior a 4.800.000? Desenquadrou no mesmo ano, independente de contratos com a Administração Pública
Exemplo 3. Empresa C, com receita bruta no ano anterior de 4.200.000 (2023). Por esse critério, ainda pode estar no Simples Nacional (nada tem a ver em ser ME/EPP, pois tal conceito é referente à receita bruta) e fazer jus ao benefício das contratacões públicas diferenciadas em 2024. Todavia, se no exercicio subsequente (2024), assinou um contrato com a Adminstração Pública em Fevereiro, no valor de R$4.800.000,01, já não fará jus mais aos benefícios das aquisições públicas diferenciadas e para o tratamento de desempate ficto para todo o ano-corrente.
@ronaldocorrea @alex.zolet

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É que há uma diferença entre cada situação. Uma coisa é desenquadramento, com finalidade fiscal, contábil e tributária, que demanda auferir receita bruta superior aos limites da LC 123/2006. Outra coisa é “desconsiderar” o enquadramento para fins de concessão dos benefícios para fins de licitações. O critério da NLLC trata de uma expectativa de receita (e não de receita efetivamente auferida).

Uma empresa ME/EPP que firme um contrato, em janeiro, de natureza continuada com a Administração, no valor total de R$ 4.800.000,12 tem a expectativa de ultrapassar o limite ao final do exercício. Assim, fica impedida de usufruir do benefício de ME/EPP para participar de outros certames. Mas não deixou de ser enquadrada como ME/EPP ao assinar esse contrato.

Isso porque a prestação e o pagamento são mensais. Ao final do primeiro mês, ela faz juz a receber, faturar, auferir R$ 400.000,01 de receita. Em outras palavras, efetivamente auferiu essa receita em um mês de trabalho. Não incorreu em nenhuma hipótese de desenquadramento. Não deixou de ser ME/EPP. Mas, em outros certames, já não pode usufruir do direito, por exemplo, de dar lance de desempate. Para outras licitações, não pode se apresentar como ME/EPP (mas de fato ela ainda é).

Se após 3 ou 4 meses de contrato ele é rescindido, constata-se que a empresa ainda não “auferiu” receita bruta superior ao limite para ser desenquadrada, embora tivesse a expectativa de atingir o limite.

Disso é possível concluir que a regra da NLLC é uma cautela para não beneficiar empresas que já possuem EXPECTATIVA de auferir, até o fim do exercício, receita superior ao limite. Mas o efetivo desenquadramento depende do EFETIVO recebimento dessa receita.

É importante diferenciar para não acontecer de se interpretar equivocadamente eventual declaração, ou determinar erroneamente à empresa que solicite o desenquadramento. Uma coisa é a empresa declarar seu enquadramento, outra é declarar se está apta a usufruir dos benefícios para fins de licitações. Tanto que no Compras.gov.br ela declara as duas coisas: qual seu porte e se faz jus ao tratamento diferenciado. No Relatório de Declarações é possível verificar isso. Tanto que não raro há empresas que declaram ser “ME ou EPP” no porte, mas declaram “Não” na opção de poder receber tratamento diferenciado.

Cabe ao administrador ter o bom senso de avaliar caso a caso se o particular eventualmente não foi desatento na hora de efetuar a declaração, se não houve confusão entre os dois conceitos, para não sairmos acusando indiscriminadamente de falsas declarações e de má-fé dos particulares.

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Excelente ponderação, @alex.zolet!

Uma verdadeira aula!

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Aproveitando o assunto, sigo então com uma dúvida minha: sendo a NLLC uma lei ordinária, não seria essa restrição imposta às ME/EPP pelo artigo 4°, §2° da NLLC uma inconstitucionalidade, posto que é reserva de lei complementar a “definição de tratamento diferenciado e favorecido para as microempresas e para as empresas de pequeno porte”, conforme art. 146, III, “d” da CF/88?

Claro que, enquanto vigente, o dispositivo da NLLC deve ser aplicado pelos administradores públicos, mas a questão é mais para debate e para saber se existe alguma definição jurisprudencial ou doutrinária a respeito do tema, e se já houve questionamentos junto à justiça, ao TCU, AGU, etc.

Talvez os professores @ronaldocorrea e @FranklinBrasil possam trazer alguma elucidação ao tema (confesso que pesquisei pouco a respeito também).

@alex.zolet,

Observe os artigos 42 a 49 da Leia Complementar n° 223, de 2006, não se enquadram como “normas gerais em matéria de legislação tributária”, para as quais a Constituição Federal exige lei complementar. Trata-se de conteúdo de norma especial federal.

Não é nada incomum o Congresso Nacional inserir em uma lei complementar conteúdos que não estão constitucionalmente reservados para esse tipo de legislação, como ocorreu, por exemplo, com a Lei Complementar n° 198, de 2023, que alterou a Lei n° 14.133, de 2021, que trata de normas gerais de licitação, para as quais a Constituição Federal não exigiu lei complementar.

Portanto, no que se refere à matéria disciplinada nos artigos 42 a 49 da LCP 123, prevalece a norma geral de licitação noma parte que trata do afastamento de tais benefícios.

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Prezados, lendo o tópico inteiro ainda tenho dúvidas, espero que consigam me ajudar.

Pois bem, é nítido que o texto do § 2º do art. 4º da lei 14.133/21 traz uma limitação para microempresas (ME) e empresas de pequeno porte (EPP) participarem de licitações e obterem os benefícios previstos na LC 123/06 (basicamente, o tratamento jurídico diferenciado). A interpretação que eu tinha até então, não era outra senão a seguinte:

  • As ME e EPP só podem participar e obter os benefícios previstos no artigo caso, no ano da licitação, a soma de todos os contratos celebrados com a Administração Pública não ultrapasse o limite máximo de receita bruta permitido para que a empresa seja enquadrada como uma EPP.

  • Esse limite de receita bruta é definido em lei e, atualmente, para EPPs, está em R$ 4,8 milhões por ano (segundo a Lei Complementar nº 123/2006).

Estabelecida essas premissas, a parte do texto que me causa dúvida é a parte negritada: “a obtenção de benefícios a que se refere o caput deste artigo fica limitada às microempresas e às empresas de pequeno porte que, no ano-calendário de realização da licitação, ainda não tenham celebrado contratos com a Administração Pública.

No contexto do parágrafo, a análise considera os contratos celebrados no ano-calendário da realização da licitação, ou seja, no ano em curso, ou estou equivocado? Se eu estiver tendo a interpretação correta, isso significaria que:

  • Contratos celebrados no ano corrente: contam, pois são explicitamente mencionados no texto legal.

  • Contratos celebrados em anos anteriores, mas com impacto financeiro no ano corrente: Esses, em regra, não são contabilizados diretamente, já que o artigo limita-se a mencionar contratos celebrados no ano-calendário atual, e não os efeitos financeiros de contratos de anos anteriores.

É uma dúvida legítima, pois não é raro que empresas firmem contratos em outros exercícios, mas que causam impactos no faturamento de exercícios seguintes. Se fosse pelo meu entendimento, esses contratos “não contariam”, no caso, para fins de aplicação do § 2º do art. 4º.

Qual a opinião dos senhores? @alex.zolet, @FranklinBrasil, @ronaldocorrea.

O TCU já se debruçou alguma vez sobre essa questão? Tentei pesquisar, mas não achei nada muito específico nesse sentido.

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Vou deixar a questão de jurisprudência para os mais experientes.

A meu ver é mais um regramento criado mas sem ter havido o devido “estresse” de exemplos práticos para verificar possíveis inconsistências, como essa que você apontou (e a outra que apontei no outro comentário).

De fato a lei se refere ao ato de celebração do contrato, e não aos efeitos financeiros dele decorrentes. Tanto que se o foco fosse nos efeitos financeiros, deveria haver uma forma de aferição regular, pois como apontei um contrato estimado em mais de 4,8mi pode não se confirmar. E, salvo melhor juízo, em relação a restrições não devemos ampliar efeitos, e sim interpretá-las de forma estrita.

Não vou entrar em filigranas de juridiquês, uma língua que não entendo direito (trocadilho intencional)

Mas a lógica da coisa me parece óbvia. O que interessa é o valor contratual que está vigente no ano-calendário da licitação em curso, porque o importante é saber se o potencial de receita anual já ultrapassa o limite, ou, como bem explicou o @alex.zolet, a EXPECTATIVA DE RECEITA.

Os entendimentos da doutrina e/ou jurisprudência, porém, nem sempre seguem a lógica que eu enxergo.