Exigência de qualificação financeira de forma cumulativa em licitação por lotes

Boa noite!
Estou em um processo de licitação de registro de preços por lotes de prestação de serviço. A mesma empresa ganhou 3 dos 4 lotes. Posso exigir balanço patrimonial de forma cumulativa para os 3 lotes mesmo que não esteja previsto em edital?

Não consegui entender o que seria “cumulativo”… o balanço patrimonial é um só, e os índices se pedidos também não tem como ser cumulativo (não pode pedir, por exemplo, 3 de índice de liquidez geral porque são 3 lotes).

A única coisa que se poderia pensar em pedir cumulativamente seria capital mínimo ou PL mínimo, ou outra exigência financeira como capital de giro mínimo, se foi estipulado com base em percentual do valor estimado (que aí poderíamos pensar no estimado acumulado dos 3 lotes). Mas sem estar no edital vira uma ginástica interpretativa…

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Tratamos do tema na 4a edição do livro de fraudes em licitações

Mais um aspecto que merece destaque é a qualificação econômica por itens ou grupos. Sobre o tema, o Acórdão TCU nº 868/2007-P entendeu que somente devem ser adjudicados a uma mesma empresa os itens ou grupos para os quais apresente os requisitos necessários para garantir o cumprimento das obrigações contratuais assumidas, ou seja, deve-se prever o somatório das condições econômicas conforme os objetos da licitação disputados pelo mesmo licitante.

Essa questão foi analisada também no Acórdão TCU nº 174/2011-P. Na análise do caso, a área técnica do TCU citou como a situação hipotética poderia ser resolvida na prática:

[se o sujeito] ultrapassou os limites de sua qualificação econômico-financeira, caberá ao licitante optar por contratações cujo valor corresponda às suas condições. Neste caso, não se trataria de desistir da proposta… mas de identificar os limites da qualificação econômico-financeira da licitante (Acórdão TCU nº 174/2011-P).

O espírito do entendimento do TCU já tinha sido emitido na longínqua Decisão nº 744/1999-Plenário: “… nas licitações cujo objeto seja divisível em itens, a exigência de comprovação de capital social ou patrimônio líquido mínimo [deve ser] proporcional à participação do licitante nessa divisibilidade”.

Essa mesma lógica foi reforçada no Acórdão TCU nº 2895/2014-P, prevendo que a empresa licitante pode participar da disputa de todos os itens, devendo o edital estabelecer critérios objetivos a fim de assegurar que somente sejam adjudicados a uma mesma empresa os itens para os quais apresente os requisitos necessários para garantir o cumprimento das obrigações contratuais assumidas.

Sintetizando, a jurisprudência do TCU vai na linha de que deve-se exigir indicadores contábeis mínimos em relação a cada item/grupo individualmente, mas também deve-se prever no edital critérios para que o licitante somente contrate aqueles itens/grupos para os quais apresente requisitos mínimos proporcionais, ou seja, levando em conta o conjunto de itens/grupos vencidos, a fim de garantir o cumprimento das obrigações contratuais assumidas. Os requisitos de habilitação econômica devem ser cumulativos, mas apenas exigíveis em relação aos itens que o licitante efetivamente venceu, e não apenas concorreu (Acórdão TCU n° 1.630/2009-P).

Para referenciar como pode ser previsto esse tipo de análise, encontramos modelo de edital de pregão para compras elaborado pela AGU, ainda sob o regime da legislação antiga, mas compatível com a NLL nesse aspecto particular. Nesse modelo de edital, está previsto que o licitante provisoriamente vencedor em um item, se estiver concorrendo em outro item, ficará obrigado a comprovar os requisitos de habilitação econômica cumulativamente, isto é, somando as exigências do item em que venceu às do item em que estiver concorrendo, e assim sucessivamente. Se não houver capacidade econômica suficiente para a comprovação cumulativa, a inabilitação recairá sobre o(s) item(ns) de menor(es) valor(es) cuja retirada(s) seja(m) suficiente(s) para a habilitação do licitante nos remanescentes.

É importante reforçar o que acontece se o licitante não comprovar capacidade econômica para tudo que venceu, quando os requisitos são avaliados de modo cumulativo. Nessa situação, o licitante deve ser inabilitado em algum ou alguns itens ou grupos, que representem o menor gravame para o licitante, ou seja, os de menor valor, recusando habilitar somente aqueles suficientes para que o licitante atinja as exigências cumulativas do item/grupo ou itens/grupos remanescente(s).

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Oi, Franklin!

Lembro que isso já tinha sido discutido antes, como nesse tópico aqui.

Acredito que a AGU tenha retirado dos modelos o subitem que exigia expressamente o somatório das condições, citado no tópico a que me refiro e copiado abaixo:

9.20.O licitante provisoriamente vencedor em um item, que estiver concorrendo em outro item, ficará obrigado a comprovar os requisitos de habilitação cumulativamente, isto é, somando as exigências do item em que venceu às do item em que estiver concorrendo, e assim sucessivamente, sob pena de inabilitação, além da aplicação das sanções cabíveis.
9.20.1.Não havendo a comprovação cumulativa dos requisitos de habilitação, a inabilitação recairá sobre o(s) item(ns) de menor(es) valor(es) cuja retirada(s) seja(m) suficiente(s) para a habilitação do licitante nos remanescentes.

Talvez a exigência (ou não) tenha ficado menos óbvia nas redações atuais, que mencionam “contratação” e “parcela pertinente”:

9.31. Caso a empresa apresente resultado inferior ou igual a 1 (um) em qualquer dos índices de Liquidez Geral (LG), Solvência Geral (SG) e Liquidez Corrente (LC), será exigido, para fins de habilitação, [capital mínimo] OU [patrimônio líquido mínimo] de [definir percentual, limitado a 10% do valor total estimado da contratação] OU [valor total estimado da parcela pertinente].

OU

9.31.1. Capital Circulante Líquido ou Capital de Giro (Ativo Circulante - Passivo Circulante) de, no mínimo, 16,66% (dezesseis inteiros e sessenta e seis centésimos por cento) do valor estimado da contratação, tendo por base o balanço patrimonial e as demonstrações contábeis do último exercício social; e

9.31.2. Patrimônio líquido de 10% (dez por cento) do valor estimado da contratação, por meio da apresentação do balanço patrimonial e demonstrações contábeis do último exercício social;

Em todo caso, não me parece plenamente claro se a “contratação” a que a AGU se refere no modelo seria de um ou de mais itens. Também existe o entendimento de que cada item é uma licitação autônoma. Além de não ser fácil ainda é difícil…

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Obrigado por compartilhar, @RianaMedella

Embora a redação atual da minuta da AGU não seja tão didática, me parece razoável supor que continua respeitando a mesma lógica.

A opção aplicável entre “contratação” e “parcela pertinente” depende de como está modelado o objeto. Tem casos em que a licitação conduz uma UMA UNICA contratação e casos em que conduz UMA PARCELA de tudo que foi colocado em disputa (licitações por item, por exemplo).

E a “parcela pertinente” nesse caso será a somatória de tudo que a mesma licitante venceu.

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Muito obrigada pelo retorno, @FranklinBrasil! Suas contribuições são muito valiosas!