Declaração de compromissos assumidos - Valor anual ou global dos contratos?

Prezados,

Acerca da declaração de compromissos assumidos, nosso edital estabelece o seguinte:

Declaração do licitante, acompanhada da relação de compromissos assumidos, de que um doze avos dos contratos firmados com a Administração Pública e/ou com a iniciativa privada vigentes na data apresentação da proposta não é superior ao patrimônio líquido do licitante, observados os seguintes requisitos:

  • a declaração deve ser acompanhada da Demonstração do Resultado do Exercício (DRE), relativa ao último exercício social; e*

-caso a diferença entre a declaração e a receita bruta discriminada na Demonstração do Resultado do Exercício (DRE) apresentada seja superior a 10% (dez por cento), para mais ou para menos, o licitante deverá apresentar justificativas.”

DÙVIDA: Para fins de cálculo da fração de 1/12 avos, devemos considerar o valor TOTAL GLOBAL dos contratos (durante toda a sua vigência ou apenas o valor TOTAL ANUAL dos referidos contratos?**

Exemplificando, no caso em tela, a licitante possui um contrato vultoso firmado com outro órgão, ainda em vigor, cuja vigência é de 5 cinco anos.

Se considerarmos o valor total do contrato por 5 anos, o valor do patrimônio líquido da empresa ficará inferior a 1/12 dos contratos firmados, ainda vigentes, e a empresa seria inabilitada.

Por outro lado, se considerarmos o valor do contrato por apenas 12 meses, o valor do patrimônio líquido da empresa ficará superior a 1/12 avos dos contratos firmados, ainda vigentes, e a empresa seria habilitada.

Isabela Ventura
Seção de Licitações do TRE/MG

@ronaldocorrea, você saberia nos orientar?

Isabela,

Eu acredito que se deva considerar o valor anual do contrato pelo seguinte: o propósito dessa verificação provavelmente é saber se o PL da empresa seria suficiente para arcar com um mês de compromissos do contrato no caso de alguma intercorrência em que fosse necessário executar a empresa. A exigência da DRE, suponho, é para verificar se a receita auferida pela empresa é compatível com o que ela informou na declaração exigida pelo órgão. A DRE normalmente é elaborada com base no período de um ano. Assim, o confronto entre os valores constantes da DRE e da Declaração serão realizados pela divisão do receita bruta por doze, pois o objetivo final, como dito, é saber se os compromissos do contrato referentes a um mês podem ser cobertos pelo PL da empresa.

Muita contabilidade envolvida, rs.

At.te,

André de Sousa

Olá, Isabela.

A IN 05/2017 explica como calcular o índice de comprometimento do PL. Veja o ANEXO VII-E, MODELO DE DECLARAÇÃO.

Ali especifica que o “Valor total dos contratos” (Nota 2) considera o valor remanescente do contrato, excluindo o já executado.

Então, seguindo a literalidade desse comando, um contrato de 60 meses, que já tenha 30 meses executados, será declarado com os restantes 30 meses, sendo esse o valor remanescente.

Isso está em aparente sintonia com a Lei 14.133/2021, Art. 69. A habilitação econômico-financeira… § 3º É admitida a exigência da relação dos compromissos assumidos pelo licitante que importem em diminuição de sua capacidade econômico-financeira, excluídas parcelas já executadas de contratos firmados.

Esse entendimento, porém, a meu ver, pode estar EM DISCORDÂNCIA com o Acórdão TCU n. 1214/2013-P, julgado que deu origem a essa exigência na norma federal.

Para defender esse ponto de vista, trago trechos do Acórdão TCU n. 1214/2013-P:

96. Essa condição pode ser aferida por meio da avaliação da relação de compromissos assumidos, contendo os valores mensais e anuais (contratos em vigor celebrados com a administração pública em geral e iniciativa privada) que importem na diminuição da capacidade operativa ou na absorção de disponibilidade financeira em face dos pagamentos regulares e/ou mensais a serem efetuados.

98. Como, em tese, grande parte das receitas das empresas de terceirização é proveniente de contratos, é possível inferir a veracidade das informações apresentadas na relação de compromisso quando comparada com a receita bruta discriminada na DRE. Assim, a contratada deverá apresentar as devidas justificativas quando houver diferença maior que 10% entre a receita bruta discriminada na DRE e o total dos compromissos assumidos.

trecho do voto do Ministro Walton Alencar Rodrigues, Relator daquele processo (Acórdão 2.247/2011-Plenário):

não identificamos irregularidade no edital ao exigir que o valor do patrimônio líquido da licitante não seja inferior a 1/12 do valor total anual constante da relação de compromissos.

Esses trechos apontam claramente que a intenção da relação de compromissos assumidos é conhecer o valor anual dos contratos vigentes da licitante. Isso é reforçado pelo fato de compararmos esse valor com a receita bruta da DRE. Ora, esse demonstrativo contábil se refere aos valores auferidos pela empresa em um ano.

Por isso mesmo é que o próprio TCU, em suas licitações, exige a soma do VALOR ANUAL de cada contrato vigente declarado pela licitante, conforme pode ser conferido no Edital do TCU, Pregão n. 50/2023, ANEXO VII – MODELO DE DECLARAÇÃO DE CONTRATOS … Contrato … “Valor anual”

Essa aparente divergência entre TCU e IN 05/2017 tinha pouca relevância no passado, porque a imensa maioria dos contratos - pelo menos os federais - eram de 12 meses, conforme pode ser conferido no artigo SUBSÍDIOS PARA GESTÃO DE RISCOS EM TERCEIRIZAÇÃO: ESTATÍSTICAS DE CONTRATOS FEDERAIS em que demonstramos que 94% dos contratos eram assinados com vigência inicial de até 12 meses, conforme essa tabela:

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Essa tendência, porém, pode se modificar, especialmente com a Lei n. 14133/2021, porque o Art. 106 previu claramente a possibilidade de celebrar contratos com prazo de até 5 (cinco) anos nas hipóteses de serviços e fornecimentos contínuos, portanto, o cenário de vigências iniciais dos contratos pode se alterar consideravelmente e, assim, esse tema da metodologia de cálculo do índice de comprometimento de Patrimônio Líquido com compromissos assumidos provavelmente terá que ser debatido e mais bem esclarecido.

Pelo que foi descrito no Acórdão TCU n. 1214/2013-P (valor anual), combinado com o art. 69, § 3º da Lei 14133/2021 (excluir parcelas já executadas), eu defendo que a melhor interpretação do comando é calcular o valor anual de cada contrato (desde que tenha vigência igual ou superior a 12 meses, do contrário, será o valor total do contrato) descontadas as parcelas já executadas no ano.

Obrigado, Isabela, por trazer o tema à luz.

Espero ter contribuído.

Franklin Brasil