Contratação de postos com dedicação exclusiva não abarcados em CCT

Na Instituição a qual me vinculo, houve contratação de postos terceirizados com base em CCT não aplicável a categorias especializadas de trabalhadores, a exemplo de psicopedagogo, interprete de LIBRAS, etc. À época, optou-se por utilizar CCT que disciplina as relações de trabalho de postos diversos, mantendo uma certa equivalência em termos remuneratórios. Mesmo assim, a medida resultou em disparidades em relação aos salários das categorias contratadas, se considerados os valores de mercado. Nesse sentido, eis o questionamento: Como proceder em caso de contratação de postos de trabalho relacionados a profissionais especializados (Ex. interprete de LIBRAS, psicopedagogo, Ledor, Transcritor, etc.), caso não haja instrumento coletivo (CCT/Acordo) aplicável às categorias pretendidas?

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Olá. O mais adequado seria realizar uma pesquisa de mercado e fixar um salário paradigma a ser observado obrigatoriamente por todos os licitantes.

Assim, a disputa ocorre com base em outros itens variáveis da planilha de composição de custos, com o “principal” do custo do posto, como um todo, que é o salário e consequentes consignatários legais - férias, 13º, adicional de férias - já garantido.

Nem vou entrar no mérito sobre convenção coletiva aplicável, pois tenho certeza que quando da licitação vocês já devem ter verificado toda a celeuma envolvida em torno dessa discussão (bem como tem tópicos a rodo aqui no fórum a respeito disso). Mas ao meu ver, o salário paradigma é a solução para mitigar esses riscos da aplicação de um salário muito aquém para o necessário dependendo da função a ser contratada.

Consulte a jurisprudência do TCU a este respeito, que é vasta e remansosa. Deixo abaixo, por exemplo, trecho do emblemático ACÓRDÃO 421/2007 - PLENÁRIO:

  1. Ora, o item serviço não é composto apenas pelo salário do empregado. Há outras variáveis que devem ser consideradas, como os custos diretos e indiretos incorridos pelo licitante, e a sua margem de lucro. Nesse ínterim, entendo que a prefixação de remuneração pretendida por aquela Casa Legislativa poderia ocorrer por meio do ajuste de um ‘salário-paradigma’, a ser pago a determinado profissional, o que não significaria, a meu ver, a fixação de preço mínimo vedada pela norma. Preço mínimo seria o todo, o item preço do serviço a ser contratado, comportando outros subitens, enquanto que tal salário, neste caso a remuneração a ser paga pela contratada aos empregados, seria uma das variáveis do preço do serviço.

  2. Há, contudo, outros pontos que devem ser considerados no presente julgamento, como aduzido pelo recorrente. Trata-se da questão da proposta mais vantajosa e a satisfação do interesse público. Reconheço que existe, sim, a possibilidade de aviltamento dos salários dos terceirizados e conseqüente perda de qualidade dos serviços, o que estaria em choque com satisfação do interesse público. Nesse aspecto, no caso de uma contratação tipo menor preço, em que as empresas mantivessem os profissionais pagando-lhes apenas o piso da categoria, entendo que não seria razoável considerar, apenas como vantagem a ser obtida pela Administração, o menor preço. Livres de patamares salariais, os empregadores, de forma a maximizar seus lucros, ofertariam mão-de-obra com preços de serviços compostos por salários iguais ou muito próximos do piso das categorias profissionais, o que, per se, não garantiria o fornecimento de mão-de-obra com a qualificação pretendida pela Administração. Sob esse prisma, entendo que a qualidade e a eficiência dos serviços postos à disposição de órgãos públicos não pode ficar à mercê da política salarial das empresas contratadas.

  3. Assim, proposta mais vantajosa não significa apenas preço mais baixo. Há que se considerar a tutela de outros valores jurídicos além do menor preço, como, por exemplo, o atendimento ao princípio da eficiência. Nada obstante, devo destacar que tal condição não abre caminho para contratação por qualquer patamar, como já ressaltado por esta Corte. O administrador continua obrigado a justificar os preços a que se propõe ajustar, e a demonstrá-los compatíveis também com as especificidades dos serviços que serão prestados e com os profissionais que irão executá-los.

  4. Quanto à questão da aplicação dos princípios jurídicos, entendo de grande relevo o posicionamento apresentado pelo Exmo. Procurador-Geral do MP/TCU em outro processo, ao tratar de matéria distinta, e transcrito no relatório supra, no sentido de que a doutrina dominante atribui força normativa aos princípios e de que ‘As demandas sociais exigem respostas céleres que somente os princípios conseguem dar. Eles representam espaço normativo capaz de abarcar situações para as quais a lei não ofereceu previsão expressa. (…) Características como baixa densidade normativa, abstração, generalidade e fecundidade permitem aos princípios englobar casos que as normas não conseguem’. Ora, está claro que o recorrente, ao apresentar suas razões, está em busca da tutela de princípios como o da eficiência, da razoabilidade, em contraponto à aplicação e interpretação estanque do art. 40, inciso X, da Lei de Licitações.

  5. Retornando ao tema central, julgo que a fixação do salário a ser pago pela licitante também não se revestiria em obstáculo à competitividade do certame, visto que todas as empresas partiriam de um mesmo patamar para apresentar suas propostas, que poderiam estar diferenciadas no tocante a outros custos incorridos pelo empregador e à margem de lucro que este se dispuser a aceitar na composição do preço do serviço. Por óbvio que nessas condições não haveria restrição à competitividade nem restaria prejudicada a possibilidade de seleção da proposta mais vantajosa, preservando-se, também, o interesse público, visto que por meio de um salário-paradigma poderiam ser contratados profissionais melhor qualificados.

  6. Também não se pode olvidar que não compete a esta Corte de Contas interferir em questões privadas, de empregado e empregador, notadamente no que toca às garantias trabalhistas ou acordos coletivos. Entretanto, este Tribunal não pode ignorar o princípio da eficiência e o interesse público presente na contratação de mão-de-obra qualificada e na necessidade de se coibir a danosa rotatividade de mão-de-obra que tantos transtornos têm causado à Administração, além da conseqüente responsabilização trabalhista que tem recaído sobre os órgãos públicos contratantes, em razão do abandono dos empregados por seus empregadores, sem o devido pagamento de seus direitos e encargos, dadas as características peculiares das contratações com fins de terceirização.

  7. Ante as considerações apresentadas, julgo que a fixação do salário-paradigma, como por exemplo, os valores já pagos em contratação anterior como remuneração aos empregados, atualizados, por certo, de forma a manter o poder aquisitivo dos valores ao tempo das respectivas contratações, pode se constituir em um referencial, como mencionado pelo ilustre administrativista citado no presente Voto, servindo para balizar as ofertas dos licitantes e para garantir a continuidade, qualidade e eficiência dos serviços prestados. Vale também frisar que o salário-paradigma é relativo aos valores recebidos pelo trabalhador, ser humano, não se confundindo com um valor de referência para coisas ou bens, como, por exemplo, o item serviço de um edital de licitação.

Espero ter ajudado! Abraço.

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Oi @jucelioazevedo, eu concordo com o @Alok. Devemos buscar o salário médio para a ocupação, a fim de não precarizar a relação de trabalho. Aqui no órgão nós contratamos diversos colaboradores cujas ocupações não tinham uma CCT específica. Para alguns nós buscamos informações em sindicatos e associações dentro do estado e em outras localidades. O site Salario é um bom ponto de partida. Para alguns colaboradores nós utilizamos a lei do salário mínimo a nível estadual, que posui diversas categorizações por atividades. Para o pessoal de Libras, nós nos antecipamos à legislação e utilizamos uma carga horária compatível com o que já estava sendo discutido no Parlamento pela FEBRAPILS e usamos o salário base do servidor de nível superior no nosso órgão (talvez não tenha sido a melhor opção). No caso do pessoal com atividades agropecuárias, utilizamos informações das associações desses trabalhadores. No caso de cuidador, a lei estadual do salário mínimo.

O grande problema disso tudo é que não sabemos os benefícios antecipadamente, como nas categorias de limpeza ou segurança, por exemplo. Daí, como as empresas que normalmente fornecem mão de obra mais “comuns” (portaria, limpeza, vigilância, copa, e similares) não conseguem entrar nessas licitações muito específicas, a saída foi deixar a possibilidade (em edital) para que a empresa vencedora apresentasse sua CCT e solicitasse uma revisão/repactuação. Existem CCT que preveem muito mais benefícios que as da SEAAC, por exemplo. Então, se não fizéssemos isso, a licitação não seria vantajosa, pois a empresa teria que pagar para prestar o serviço. Na verdade, entendemos a possibilidade de revisar/repactuar baseado na CCT, após a assinatura do contrato, como uma brecha, mas não temos certeza da legalidade disso. De qualquer modo, funciona bem e a gestão do órgão está ciente de que o valor de referência “real” pode ser um pouco maior (nós simulamos o valor real com a média dos benefícios de outros contratos). Por sorte, os lances têm sido menores que os valores de referência e nós não ultrapassamos a previsão orçamentária. E como adotamos uma “política ativa” de glosa de valores não utilizados, tanto na fiscalização mensal, quanto nas prorrogações, estamos com saldo orçamentário “positivo”.

Não estou dizendo que nossa abordagem é correta, mas ela passa pelo crivo da Procuradoria Federal e pelo Ordenador de Despesa. Se eles acatam, imagino que não haja ilegalidade (não sou operador do Direito).

Espero ter ajudado de alguma forma e gostaria da opinião dos colegas sobre nossa abordagem.

Valeu!

PS: Editei algumas coisas para deixar o POST mais claro, mas não alterei o sentido inicial.

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Eu acho que o procedimento está correto sim.

Até onde entendo, o salário paradigma também pode ser estabelecido mesmo quando há CCT com a função específica, pois as vezes a administração precisa de um perfil mais qualificado para os serviços, o que justificaria um salário maior, evitando rotatividade.

Quanto a questão dos benefícios, entendo que se deva utilizar a CCT mais “provável” de ser utilizada na licitação, no caso das funções que não existam em nenhuma convenção coletiva.

No caso de ela existir em mais de uma, então ao meu ver, o correto seria utilizar a CCT com os maiores benefícios, mas em ambos os casos, abrindo a possibilidade de o licitante adequar de acordo com sua realidade (devido a conhecidíssima questão do enquadramento sindical - só não o salário paradigma, claro).

Note que falamos aqui de ESTIMATIVA. Então, tem que considerar sempre as piores hipóteses assim como o “pior” regime de tributação (lucro real, com as alíquotas cheias, mesmo sabendo da possibilidade do licitante adequar de acordo com as deduções que esse regime permite). Sendo mera estimativa, isso não vai eximir a empresa de elaborar a sua proposta e apresentá-la de acordo com sua realidade tributária e enquadramento sindical correto.

É isto. No mais, eu sou operador do direito e acho que, juridicamente, esse procedimento é sim o correto e em consonância com todos os pareceres e entendimentos que conheço até então. Lógico que é uma situação excepcional e demandará sempre de justificativa técnica. Não pode sair por aí impondo salário paradigma pra serviços ordinários que são corriqueiros, muito bem definidos em ccts (limpeza, vigilância, etc) e não demandam nenhum requisito/conhecimento especifico do prestador de serviços (que é o pulo do gato, quando falamos em salário paradigma).

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Então @Alok, nós fazemos tudo isso que você indicou, contudo, são decisões de servidores que possuem pouco, ou nenhum, apoio da área jurídica. As pessoas responsáveis por analisar leis, normativas, CCT e outros instrumentos jurídicos não possuem formação nesta área. Por exemplo, eu sou de Exatas. Mas como entendo que leis são 90%, ou mais, interpretação de texto e o restante conhecimento jurídico, especialmente sobre processo e jurisprudência, não me sinto tão “órfão”. O problema é que existem diversos órgãos (especialmente os menores) em que as pessoas têm muito mais dificuldade em interpretar leis e procurar informações na Internet. A Administração Pública peca muito ao “jogar” qualquer um nessas tarefas que exigem bastante conhecimento e experiência das áreas tributária, trabalhista e previdenciária. Normalmente jogam os recém empossados, pois ninguém quer essa “bucha”.
Mudanças de leis são sempre um problema, assim como interpretação de CCT. E para piorar, nem os sindicatos ajudam a interpretar corretamente o que acordaram nos instrumentos de negociação coletiva. É onde o GestGov/Nelca brilha!!! Mesmo assim, a ajuda que obtemos aqui não é oficial e sempre corremos o risco de sermos apontados pelo TCU, especialmente quando inovamos. Por isso, nós sempre criamos relatórios com justificativas (normas, leis, jurisprudências e raciocínio) para todas as nossas decisões.

A título de exemplo de como é impossível, às vezes, prever um valor de referência para uma determinada contratação, estou anexando duas CCT e uma minuta de relatório que estamos preparando para uma das situações que mencionei no POST anterior, caso tenham interesse. Uma das CCT é do Sindiasseio/RS e outra é do SESCON/RS (ambos sindicatos empresariais). A diferença entre os benefícios é enorme! E não seria possível anteciparmos os valores dos benefícios, pois nunca havíamos tido contato com uma empresa que fosse representada pelo SESCON/RS.

CCT RS003094-2023.pdf (358,4,KB)
(apagar) Minuta.pdf (201,9,KB)
CCT RS000044-2023.pdf (306,2,KB)

PS: O arquivo da minuta não está completo, pois achei melhor omitir as outras partes do relatório que ainda estão sendo desenvolvidas ou possuem informações específicas da empresa, apesar dele se tornar público depois de assinado. No momento está restrito, pois ainda está em fase de preparação.

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Ajudou bastante meu caro! Irei consultar o Acordão.

Então, neste caso que vc mencionou, eu já revelei o meu entendimento pra contornar essa situação. Veja meu penúltimo comentário:

Pra fins de ESTIMATIVA, não tem problema utilizar o maior valor. Na verdade, creio ser o recomendado em situações como essa, onde existem duas convenções possivelmente aplicáveis para o mesmo objeto. Assim, quem “pertencer” ao sindicato cujos benefícios tem maior valor, mantém esses benefícios na planilha. Quem “pertencer” àquele que tem benefícios cujo valor é menor, então altera, reduzindo na planilha.

Em ambos os casos, as empresas precisam comprovar a assertividade da CCT utilizada, Não é aleatório.

Creio que criamos muito pelo em ovo quando falamos de Estimativa, como se isso eximisse a empresa de apresentar os custos dela de acordo com a sua REALIDADE… O que está na planilha vale pra fins referenciais apenas, mas a responsabilidade pelo correto preenchimento, comprovação de enquadramento, alíquotas de tributos, etc. é de total responsabilidade da empresa. Assim como não se pode “escolher” regime de tributação na planilha e na prática ser outro, essa situação é a mesma com a convenção coletiva adotada pela empresa. Em regra, vigora no ordenamento jurídico brasileiro o princípio da unicidade sindical. Ou seja, nenhuma empresa pode sair escolhendo a bel prazer qual convenção vai adotar para fins de licitação.

Grande abraço.

Então, mas o problema reside no fato de que nós nem sabíamos da existência da CCT da SESCON/RS, portanto, ela não poderia ter sido usada como parâmetro de “maior valor”. Teoricamente, teríamos que analisar todas as CCT existentes no RS para criar um valor referencial que atendesse a qualquer empresa que pudesse/quisesse participar da licitação. Mas isto geraria um trabalho enorme, e duvido que alguém faça assim.
Um outro problema é que se fizéssemos isso, então o valor referencial seria tão alto que poderia gerar prejuízo para a Administração. Em outras palavras, as empresas participantes poderiam transferir os excessos para outras verbas (insumos, lucros, custos indiretos, etc). Até onde sei, nada impede que a empresa defina 35% de lucro ou de custo indireto.
Aqui no órgão estamos contando os centavos e a área de Terceirizados é a mais cobrada para reduzir custos. Só para ter uma ideia, mais de 60% dos custos discricionários estão nos Terceirizados. Isso, sem contar que a equipe é reduzida e sem especialistas nas áreas necessárias (citadas anteriormente). Creio que esse seja o mesmo problema em praticamente todos os órgãos públicos de todas as esferas.

Sim, nós entendemos isso, mas cada empresa vai se sindicalizar de acordo com sua atividade. No caso desse contrato em particular, foi a SESCON/RS. Veja que a outra CCT foi anexada no POST anterior somente para efeitos de comparação. Não só de benefícios, mas também de complexidade. Além do reflexo financeiro há reflexo na fiscalização contratual. Para mim, ela é um “cisne negro”. Ela também é ruim para a empresa, tanto que estão avaliando a mudança da atividade principal da empresa para poderem se associar a outro sindicato “menos complicado”.

Nossa avaliação, desde o início é que a contratação de intérpretes de Libras não deveria ser feita como DEMO, pois envolve muitos parâmetros que mudam a cada semestre. E para piorar, existe um discurso muito forte sobre precarização do trabalho e uma aversão a contratos de trabalho mais flexíveis, tais como os intermitentes. E tem-se a ideia de que o dinheiro é infinito e que devemos criar a demanda (seja lá qual for) para o erário ter a obrigação de pagar por ela. É a cultura dos órgãos públicos, me parece. No caso de cuidadores e intérpretes de Libras, o limite é o que for demandado do órgão, não um limite máximo imposto pelas condições estruturais do órgão. Por exemplo, se mil alunos se matricularem com necessidades especiais, então teremos que “contratar” o que for necessário para atendê-los. E o MP cobra isso (atendimento para todos que precisam), de certa forma. E as leis permitem e encorajam isso (de certa forma obrigam a Administração a atender a demanda). É tudo muito mais complexo do que parece. Felizmente, nossas planilhas aceitam qualquer quantidade de colaboradores. Basta o gestor indicar a quantidade que todos os cálculos são feitos e ele terá o valor de referência. E isso me dá medo, pois nem sempre os demandantes entendem que “dinheiro não nasce em árvore”.

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