Licitação - Convenção Coletiva x Acordo Coletivo

Bom dia, pessoal!

Numa licitação de transporte escolar, o Termo de Referência prevê que, na planilha de composição de custos, deverá ser considerada a Convenção Coletivo (CCT) pertinente à região.

Uma licitante inseriu valores de salário e auxílio-alimentação menores do que os previstos na convenção sob o argumento de que teria um Acordo Coletivo (ACT).

A dúvida que surge é a seguinte: a Reforma Trabalhista, ao alterar o art. 620 da CLT, estabelece a prevalência do ACT sob a CCT, ainda que seja norma menos favorável. No entanto, não haveria ofensa ao princípio da isonomia uma vez que as licitantes disputariam em condições de desigualdade? Como vocês enxergam essa situação?

Eu pensei da seguinte maneira: no âmbito da participação no processo licitatório, a empresa deveria atender à obrigatoriedade prevista no Termo de Referência (a fim de que haja um tratamento isonômico entre as licitantes), mas, quando da execução contratual, poderia praticar os valores previstos no ACT, sem que haja ofensa às normas trabalhistas.

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Olá, @LeonardoLB !

Nas licitações no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, esse assunto foi pacificado com os seguintes normativos:

  1. DECRETO Nº 12.174/2024;
  2. INSTRUÇÃO NORMATIVA SEGES/MGI Nº 176, DE 25 DE NOVEMBRO DE 2024 (Atualizada) — Portal de Compras do Governo Federal.

Obrigado, @Iago !! Vou dar uma lida.

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Posso estar errado, pois não é minha área de atuação, mas salvo engano não é possível obrigar o licitante seguir uma CCT específica.

No entanto, o que as normas indicadas pelo @Iago indicam é que podem (e até devem) ser fixados valores mínimos para os custos relevantes (o que resolve em boa medida a questão da isonomia entre os participantes). Note que é diferente de obrigar a seguir uma CCT. Mas lembre que essa fixação precisa ser justificada nos estudos.

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Perfeito, @alex.zolet. Após ler as normas que o @Iago indicou, tive o mesmo entendimento que o seu.

Posso estar errado e, se estiver, peço que me corrijam: com relação à execução contratual, a licitante poderá seguir o eventual Acordo Coletivo que tenha subscrito, certo? Ainda que o ACT estipule salário, auxílio-alimentação e/ou benefícios menores.

Com a observação de que, para fins de repactuação, deverá ser considerada a norma coletiva mais benéfica.

Olá, @LeonardoLB !

Pesquise pela palavra “paradigma” na INSTRUÇÃO NORMATIVA SEGES/MGI Nº 176, DE 25 DE NOVEMBRO DE 2024. Acredito que o art 9º da IN responde a sua pergunta.

@Iago Mas então, o art. 9º estabelece que para fins de repactuação que deverá ser considerada a norma coletiva mais benéfica.

Eu interpretei no sentido de que esse tratamento se refere apenas à repactuação.

Olá, @LeonardoLB !

Entendo que funcionará da seguinte forma:

  1. Administração fixa no TR os custos mínimos relevantes, utilizando um (a) ACT/CCT/DCT “paradigma” (arts. 3º e 4º da IN n. 176/2024);
  2. No certame, a empresa poderá utilizar a ACT/CCT/DCT do seu ramo de atividade (diferente da “paradigma”), mas não poderá reduzir os “custos mínimos relevantes” (art. 7º da IN n. 176/2024);
  3. Na execução contratual, caso a proposta da licitante não esteja vinculada ao (à) ACT/CCT/DCT “paradigma” e quando a proposta foi vinculada ao ramo de atuação da empresa, os “custos mínimos relevantes” serão reajustados pelo índice que for mais vantajoso para o trabalhador (§§§ 1º, 2º e 3º, do art. 9º, da IN n. 176/2024).

@Iago não sei se foi isso que você quis dizer, mas vou dar minha opinião sobre o item 3 que citou. Para tal trago abaixo trecho da IN 176/2024:

Art 9º Os órgãos ou entidades contratantes deverão preservar os direitos mais benéficos ao trabalhador durante a execução contratual caso o Acordo, Convenção Coletiva ou Dissídio Coletivo ao qual a empresa contratada está vinculada seja diferente do Acordo, Convenção Coletiva ou Dissídio Coletivo utilizado como paradigma para definição dos custos unitários mínimos relevantes, para fins de repactuação.

§ 1º A correção dos valores mínimos de remuneração, incluindo salário base e adicionais, e dos benefícios estabelecidos, será realizada com base nas cláusulas de reajuste percentual do Acordo, Convenção Coletiva ou Dissídio Coletivo ao qual a empresa contratada está vinculada, quando este for diferente do Acordo, Convenção Coletiva ou Dissídio Coletivo paradigma.

§ 2º A repactuação será realizada com base na apuração da diferença percentual entre os valores previstos no Acordo, Convenção Coletiva ou Dissídio Coletivo anterior e o que entrou em vigor quando inexistir cláusula de previsão de reajuste percentual no Acordo, Convenção Coletiva ou Dissídio Coletivo ao qual a empresa contratada está vinculada.

§ 3º Deverão prevalecer os valores que forem mais benéficos ao trabalhador caso o Acordo, Convenção Coletiva de Trabalho ou Dissídio Coletivo ao qual a empresa contratada está vinculada venha a estabelecer valores de remuneração, incluindo salário base e adicionais, de auxílio-alimentação e de benefícios superiores aos valores estabelecidos na contratação ou superiores à aplicação dos percentuais previstos nos §§ 1º e 2º.

Com a leitura do trecho da Instrução Normativa, percebe-se que a CCT paradigma foi definida exclusivamente para fins de formulação da proposta na licitação, o que é o correto pois sabemos que empresas vinculadas a outros sindicatos podem, eventualmente, vencer o certame.

Nesse sentido, é preciso termos cautela na interpretação do termo “benéfica” referido na norma. Ele não se aplica às condições, mas exclusivamente a valores envolvidos. Uma leitura equivocada poderia levar à interpretação de que, caso a nova CCT do mesmo sindicato da convenção paradigma estabeleça percentuais de reajustes maiores para salários e benefícios do que os fixados na CCT do sindicato ao qual a contratada esteja vinculada, a Administração estaria obrigada a segui-los.

Minha interpretação diverge dessa visão, já que o percentual a ser utilizado para repactuação deve ser o previsto na CCT à qual a contratada esteja vinculada. A única exceção seria se essa CCT específica estipulasse, por exemplo, um auxílio-alimentação superior ao valor que resultaria da aplicação do reajuste previsto na CCT sobre o valor pactuado no contrato.

Apesar dessa possibilidade excepcional prevista na Instrução Normativa, considero improvável que ela se concretize com frequência. Isso ocorre porque, caso os salários ou benefícios previstos na CCT à qual a empresa contratada esteja vinculada fossem superiores aos da CCT paradigma, já na proposta, por força do §3º, do art 7 da IN, deveríamos desconsiderar os valores da CCT paradigma.

Também porque penso ser raro que haja uma variação grande entre categorias que acarretem em valores de salário e benefício muito diferentes. Contudo, a IN, de forma prudente, já prevê essa eventualidade e estabelece diretrizes claras para lidar com situações excepcionais.

Por esse meu entendimento, recai uma preocupação adicional já amplamente discutida no NELCA, relacionada à publicação de uma nova CCT após a divulgação do certame. De praxe, orientamos que todos os licitantes formulem suas propostas com base na CCT antiga, permitindo que, após a formalização do contrato, seja realizado o apostilamento necessário.

Entretanto, com a norma atualmente vigente, na minha leitura estritamente literal da Instrução Normativa, percebo que essa prática não seria aplicável nos casos em que empresas vinculadas a sindicatos diferentes do paradigma fixado na licitação vençam o certame. Nesse cenário, a norma afastaria a CCT paradigma como referência para a repactuação, devendo ser aplicada a CCT à qual a contratada efetivamente esteja vinculada.

Funcionários que percebam que estão sendo contratados com valores inferiores aos estabelecidos pela CCT de seu sindicato podem sentir desvalorização profissional, gerando insatisfação e desmotivação, que pode culminar até na evasão de talentos, uma vez que os funcionários podem buscar oportunidades em outras empresas, especialmente aquelas que oferecem salários mais compatíveis com a sua CCT.

São reflexões que serão discutidas com o tempo.

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Olá, @rodrigo.araujo !

A (o) ACT/CCT/DCT “paradigma” serve para a definição dos “custos mínimos relevantes".

Sobre isso, antes da publicação da IN n. 176/2024, o TCU se manifestou:

Acórdão n. 1207/2024-TCU-Plenário
(…)
Esclarece-se que a medida proposta acima:

visa apenas a estabelecer um limite inferior à remuneração do empregado terceirizado no serviço público, tanto que se atém às parcelas de salário e auxílio-alimentação;

não impõe a adoção de uma determinada CCT para os licitantes, que continuam atrelados à respetiva CCT imposta pela legislação trabalhista;

não implica restrição à competitividade do certame, pois não veda a participação de qualquer licitante idôneo a prestar os serviços objeto do certame, ainda que localizado em outra base territorial onde o serviço será executado, havendo competição em relação aos demais itens de custo e margem de lucro;

não interfere nos critérios de enquadramento sindical previstos na CLT e tampouco viola o princípio da unicidade sindical estabelecido na Constituição Federal;

não se confunde com a fixação do valor do salário e do auxílio-alimentação, tendo em vista que cada licitante será livre para elaborar sua planilha de custos e formação de preços (PCFP), observando o limite inferior ora proposto e os demais benefícios e condições estabelecidos na CCT à qual cada licitante está vinculado.

Não é demais enfatizar que a introdução de novo critério de aceitabilidade da proposta para a contratação de serviços contínuos com dedicação de mão de obra não representa interferência do Tribunal de Contas em matéria de organização sindical, tanto que não impõe a adoção de qualquer CCT ou alteração das regras de enquadramento sindical.

Igualmente deve ser ressaltado que a medida ora proposta se restringe ao agregado de salário e auxílio-alimentação com base na CCT mais adequada à categoria profissional afeita ao serviço, não sendo cabível ao órgão público consignar no edital a observância de outros benefícios ou condicionantes previstos na CCT paradigma, uma vez que cada licitante continua atrelado à CCT à qual se vincula pelas regras sindicais.

Nesse aspecto, a Administração Pública não se exime de cumprir integralmente o disposto no art. 135 da Lei 14.133/2021, especialmente quanto à vedação de se vincular às disposições prevista em CCT que tratem de obrigações e direitos que somente se aplicam aos contratos com a Administração Pública, bem como tratem de matéria não trabalhista, de pagamento de participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados do contratado, ou que estabeleçam direitos não previstos em lei, como valores ou índices obrigatórios de encargos sociais ou previdenciários, bem como de preços para os insumos relacionados ao exercício da atividade.

No que tange ao instituto da repactuação do contrato, definido no inc. LIX do art. 6º da Lei 14.133/2021, considera-se que o edital deve estabelecer a aderência à convenção coletiva do trabalho à qual a proposta da empresa esteja vinculada para fins de atendimento à eventual necessidade de repactuação dos valores decorrentes da mão de obra, inclusive salário e auxílio-alimentação, consignados na planilha de custos e formação de preços do contrato, em observância ao disposto no inc. II do art. 135 da Lei 14.133/2021.

Compreende-se assim que, ao estabelecer limite inferior para os componentes agregados de salário e auxílio-alimentação da remuneração do empregado terceirizado na Administração Pública Federal, além de atender aos objetivos do processo licitatório (art. 11, inc. III, Lei 14.133/2021), e evitar os riscos de a Administração Pública ser condenada subsidiariamente a arcar com o ônus financeiro trabalhista em razão de a empresa contratada ter adotado convenção coletiva inadequada, a medida ora proposta assegura o alinhamento das contratações, a fortiori, com a própria Constituição Federal , a qual assenta a valorização do trabalho humano como fundamento da ordem econômica (art. 170, caput, CF).

Trata-se, por esse aspecto, de medida paliativa, à guisa de rede de proteção para limitar a precarização da mão de obra terceirizada no serviço público e o risco de ônus financeiro trabalhista para a Administração Pública, válida enquanto o poder legislativo não editar uma lei específica para tratar a problemática do enquadramento sindical nas terceirizações, especialmente quando o tomador de serviços é a Administração Pública.

Lembra-se que a Declaração da Filadélfia, de 1944, adotada pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) como anexo à sua Constituição, ratificada pelo Brasil, estabelece o princípio de que o trabalho não é mercadoria.

Nessa linha de entendimento, merece destaque a colocação do Min. Marcos Vilaça, na qualidade de relator do Acórdão 256/2005-TCU-Plenário, ao rejeitar a suposição de que o princípio da vantajosidade deva prevalecer a qualquer custo, pelo contrário, asseverou que a terceirização de mão-de-obra no setor público, quando legalmente permitida, não pode ser motivo de aviltamento do trabalhador, com o pagamento de salários indignos.

Por último, deve ser observado que a referida proposta de fixação de limite inferior às parcelas de salário e auxílio-alimentação somente é cabível nos casos de terceirização de mão de obra com alocação exclusiva de postos de trabalho, sendo vedado tal procedimento quando os serviços prestados pelo contratado devam ser medidos e pagos por resultados, em conformidade com a jurisprudência deste Tribunal a respeito de fixação de remuneração mínima no edital.

Considerando que a resposta à consulta tem caráter normativo, nos termos do § 2º do art. 1º da Lei 8.443/1992, propõe-se que a futura deliberação desta Corte sobre esta consulta seja encaminhada à Secretaria de Gestão e Inovação do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, na qualidade de órgão central do Sistema de Serviços Gerais - Sisg, considerando que essa Secretaria detém competência para normatizar e propor atos normativos para aplicação da legislação de licitações e contratações, no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional.

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