Recurso Intempestivo

Prezados,

Gostaria de solicitar ajuda em um caso específico de um pregão que estou operando. A questão é a seguinte:

Empresa x registrou sua intenção de recurso em campo especifico do sistema Licitações-e, mas não motivou sua manifestação, declarando de forma genérica e sem a mínima fundamentação dos motivos que justificassem a pretensão, configurando ato protelatório e/ou procrastinatório. Desta forma, deneguei a recepção do recurso no próprio sistema.

Ocorre que mesmo após a negatória da recepção do recurso no sistema, a empresa x encaminhou a peça recursal.

Minhas dúvidas são:

1 - Preciso fazer um parecer deste recurso, informando sobre sua intempestividade?
2 - Se sim, preciso encaminhar parecer para analise e superior decisão do Prefeito.
3 - Por ultimo, preciso publicizar a decisão final?

Michelle,
Bom dia.
Eu entendo que, uma vez negada a intenção de recurso, não há recurso, em termos administrativos. Eu ignoraria por completo a documentação enviada. A empresa, se quiser, pode recorrer à Justiça. Então:
1- Eu não faria. Informaria nos autos que a empresa X apresentou intenção de recorrer e que a mesma não foi aceita, informando minhas razões para ter negado a intenção de recurso.
2- N/A
3- N/A
Eu, pelo menos, agiria assim.
Espero que ajude.
Att.,
Daniel
UFSCar

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@michellecardoso!

Em primeiro lugar, eu creio que não podemos negar intenção de recurso analisando o mérito da questão, como você parece ter feito. Eu tenho uma opinião de que recurso administrativo em licitação é direito disponível da empresa e ela usa se quiser. Não é, nunca foi e nunca será um prazo que esteja sob o controle da Administração. Até mesmo por isto eu não acho nenhum fundamento para caracterizar um recurso como protelatório, quando na verdade esse lapso temporal nunca esteve sob o controle da Administração e, portanto, não tem lógica apontar “atraso” de um prazo que nunca foi nosso, e nunca será.

Eu escrevi umas apressadas linhas sobre isto, que pode ajudar a entender melhor meu ponto: Sollicita

Já sobre a questão específica do envio pela empresa das razões recursais, a mim parece não importar tanto assim se tem ou não recurso, se atendeu ou não os pressupostos recursais. A mim, importa muito mais é saber se a empresa reclamante tem razão. Eu sempre oriento que, independentemente da empresa cumprir ou não os pressupostos recursais, se a Administração receber uma reclamação somos obrigados a analisar e apresentar uma resposta, diante do direito constitucional de petição. Nesse ponto eu respeitosamente discordo do colega @Daniel_Kraucher, pois não vejo como apontar que seria necessário contar com a tutela jurisdicional do Poder Judiciário.

Constituição Federal de 1988
XXXIV - são a todos assegurados, independentemente do pagamento de taxas:
a) o direito de petição aos Poderes Públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso de poder;

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Boa tarde, @ronaldocorrea
Talvez você esteja correto na questão de analisar o texto enviado pela empresa. Não custa nada. Caso a Administração, ao ler o texto, avalie que há algo a ser corrigido, entendo que poderia ser corrigido em função da prerrogativa de autotutela, mas não por análise de recurso, já que não houve recurso, que é onde parece estar a divergência mais de fundo. Eu sou totalmente a favor do direito a recursos. Acho que ajuda a Administração. No entanto, como todo direito, não acho que seja absoluto.
Uma vez que o pregoeiro deve avaliar se há, na intenção de recurso, os pressupostos recursais (sucumbência, tempestividade, legitimidade, interesse e motivação) - e até aqui concordamos-, não vejo como não concluir pela possibilidade do pregoeiro de negar a intenção de recurso. Do contrário, poder-se-ia excluir o momento da “intenção de recorrer” e abrir diretamente os prazos recursais. Ainda que os recursos estejam dentro do prazo do pregão, avalio ser possível um recurso ser meramente protelatório e acho que faz parte da função do pregoeiro zelar pelo pregão nesse sentido.
Um exemplo pessoal, do primeiro pregão em que tive que analisar uma intenção de recurso: Eu trabalhava na Universidade Federal de Goiás e a empresa vencedora estava impedida de licitar com um órgão estadual do Pará, se não me engano. Uma empresa manifestou intenção de recorrer nos seguintes termos: “a empresa melhor classificada está impedida de licitar”. Para todos os efeitos, não estava. A penalidade não abrangia a UFG. A intenção de recurso era inepta. Não se trata de entrar no mérito, mas de avaliar se há a mínima plausabilidade. Quaisquer que sejam as divergências de entendimento sobre a abrangência das penalizações (8666 X lei do pregão etc.), nenhuma delas vai estender o impedimento de contratar com um órgão estadual a um órgão federal, situado em outro estado. Isso é tema pacificado. Como era minha primeira vez, a cautela ainda me fez explicar isso à licitante no chat, antes de negar a intenção de recurso. A licitante respondeu algo assim: “O edital diz que não poderão participar interessados “proibidos de participar de licitações e celebrar contratos administrativos, na forma da legislação vigente”. O edital não diz explicitamente que a abrangência da proibição deve alcançar o órgão que vai contratar”. Haveria algum sentido em levar esse debate adiante? Me parece que seria perder o tempo de todo mundo, inclusive da recorrente, que se aferraria a uma suposição falsa a parir um recurso natimorto.
Mas sei que é tema difícil, ainda mais nos tempos estranhos em que vivemos. Me causa algum desconforto às vezes ver meu posicionamento podendo ser assemelhado, ainda que vagamente, com visões totalitárias de Estado ou, ao menos, visões restritivas das margens de controle democrático. Há outros temas em que isso acontece, como sanções administrativas, porque na antítese temos uma visão permissiva de Estado em relação à inciativa privada. Me sinto sempre no fio da navalha, o que só me faz valorizar ainda mais os debates que participo ou acompanho por aqui.

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