Possibilidade de inabilitação antes da análise da proposta

As fraudes que, até onde sei, o Decreto buscou mitigar, se referem ao comportamento “coelho”, quando empresas participam do pregão de forma combinada, uma delas mergulha no lance e depois “desiste”, por exemplo, deixando de apresentar documentos de habilitação.

Nesse sentido, esta notícia da Editora Forum:
https://www.editoraforum.com.br/noticias/decreto-do-novo-pregao-eletronico-inibira-fraude-conhecida-como-coelho-nas-licitacoes-afirma-especialista/

Cito um trecho:

Esta medida auxiliará no combate à fraude conhecida como coelho, a qual um licitante termina a fase de lance em primeiro lugar, com uma proposta de valor excessivamente baixa, e, antes de enviar a sua documentação, faz um acordo com o segundo colocado sobre a sua desistência na disputa.”

A mesma lógica pode ser lida nesse artigo do excelente site OLicitante, do incrível Dawison Barcelos:
https://www.olicitante.com.br/inovacoes-pregao-eletronico-propostas-novo-decreto/

Além disso, a medida auxiliará no combate à denominada fraude “novo coelho”, em que determinado licitante termina a fase de lances em primeiro lugar e, antes de enviar sua documentação ajusta em conluio com o segundo colocado a sua “desistência”, facilitada pela possibilidade de enviar algum documento incompleto que promoverá a sua inabilitação e a desejada exclusão do certame sem que, posteriormente, seja instaurado processo de aplicação de penalidades.

Ora, veja-se que o objetivo da coisa é evitar o coelho. Evitar empresa que tenta FUGIR do certame, depois da fase de lances.

Mas isso é totalmente diferente da empresa que tenta FICAR no certame e se habilitar, mesmo tendo cometido alguma falha no envio dos documentos na etapa anterior.

Por isso defendo tratamento distinto para as duas situações:

(1) Não anexou antes e não tá nem aí (coelho) = apura punição
(2) Não anexou antes e envia depois = habilita

Invoco, para me ajudar a defender essa tese, o próprio Decreto 10.024, na parte dos princípios:

Princípios
Art. 2 …
§ 2º As normas disciplinadoras da licitação serão interpretadas em favor da ampliação da disputa entre os interessados, resguardados o interesse da administração, o princípio da isonomia, a finalidade e a segurança da contratação.

E mais:

Art. 17. Caberá ao pregoeiro, em especial:

VI - sanear erros ou falhas que não alterem a substância das propostas, dos documentos de habilitação e sua validade jurídica;

É obrigação do pregoeiro sanear falhas que não alterem a substância dos documentos e sua validade jurídica.

Para ilustrar meu ponto de vista, trago à luz o Acórdão TCU n. 857/2015 - P. O Tribunal foi instado a se manifestar sobre a habilitação de uma empresa que tinha “esquecido” de apresentar inscrição no cadastro de contribuinte municipal ou estadual, que era exigida no Edital de um pregão eletrônico. O TCU entendeu que “a falta do documento em si” não era relevante, posto que havia outros elementos suficientes para comprovar o que se pretendia, o ramo de atividade", demonstrando que mais importante que o documento é a verdade dos fatos.

Cito, ainda, o ensinamento do Ministro Sepúlveda Pertence do STF no RMS 23.714/DF:

“Se de fato o edital é a ‘lei interna’ da licitação, deve-se abordá-lo frente ao caso concreto tal qual toda norma emanada do Poder Legislativo, interpretando-o à luz do bom senso e da razoabilidade, a fim de que seja alcançado seu objetivo, nunca se esgotando na literalidade de suas prescrições. Assim, a vinculação ao instrumento editalício deve ser entendida sempre de forma a assegurar o atendimento do interesse público, repudiando-se que se sobreponham formalismos desarrazoados. Não fosse assim, não seriam admitidos nem mesmos os vícios sanáveis, os quais, em algum ponto, sempre traduzem a infringência a alguma diretriz estabelecida pelo edital.

Desta forma, se a irregularidade praticada pela licitante vencedora a ela não trouxe vantagem, nem implicou em desvantagem para as demais participantes, não resultando assim em ofensa à igualdade; se o vício apontado não interfere no julgamento objetivo da proposta, e não se vislumbra ofensa aos demais princípios exigíveis na atuação da Administração Pública, correta é a adjudicação do objeto da licitação à licitante que ofereceu a proposta mais vantajosa, em prestígio do interesse público, escopo da atividade administrativa.”

Apesar de defender esse posicionamento em favor do formalismo moderado, respeito e entendo, obviamente, a interpretação literal do Decreto 10.024 e a inabilitação de quem esquece um documento. N

4 curtidas