Pagamento da Garantia Contratual

Prezados Nelquianos,

Diante da restrição orçamentária por parte do governo federal e por não ocorrer os repasses dos restos a pagar de dezembro, uma das empresas prestadoras de serviços, por não possuir recursos em caixa para o pagamento de sua folha de pagamento, solicitou a liberação da garantia contratual. Seria possível essa liberação por parte da administração?

Como determina o parágrafo único do Artigo 65 da IN 05/2017, só é previsto caso não ocorra no prazo de quinze dias a quitação das obrigações, pergunto é possível ser antes desse prazo, visto que a contratada solicitou antes, por já saber que não possui os recursos?

Diante das informações de que não tem previsão dos repasses e que a contratada gostaria de seguir as determinações trabalhistas de que tem até o 5º dia util para o pagamento aos seus colaboradores, o que nesse caso vence amanhã, podemos liberar diante dessas circunstâncias?

Art. 65. Até que a contratada comprove o disposto no artigo anterior, o órgão ou entidade contratante deverá reter:
I - a garantia contratual, conforme art. 56 da Lei nº 8.666, de 1993, prestada com cobertura para os casos de descumprimento das obrigações de natureza trabalhista e previdenciária pela contratada, que será executada para reembolso dos prejuízos sofridos pela Administração, nos termos da legislação que rege a matéria; e
II - os valores das Notas fiscais ou Faturas correspondentes em valor proporcional ao inadimplemento, até que a situação seja regularizada.
Parágrafo único. Na hipótese prevista no inciso II do caput, não havendo quitação das obrigações por parte da contratada no prazo de quinze dias, a contratante poderá efetuar o pagamento das obrigações diretamente aos empregados da contratada que tenham participado da execução dos serviços objeto do contrato

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Gostaria de saber se a garantia foi apresentada na forma de dinheiro caução ou por apresentação de apólice? Pois se for para acionar a apólice, a seguradora exige vários documentos para solicitar e configurar a razão do levante. No mais, coaduno com sua dúvida. O assunto é relevante!

Prezada Karine,

Foi apresentada na forma de dinheiro caução.

Questão muito interessante no nosso dia-a-dia de administrador, porque a princípio é uma relação de boa fé e parceria entre as duas partes interessadas.
Mas a resposta é:
NÃO, NEM PENSAR!!!

Explico: esqueça que existe um dinheiro depositado no banco (caução), ou só lembre dele se já estiver com a rescisão contratual em mãos. Da mesma forma que um inquilino normal (quem aluga casa sabe desta modalidade), aqueles três meses de aluguel não são para “pagar” um eventual atraso, mas sim para ter um mínimo de garantia que, após um eventual despejo, consiga se arcar com uma reforma básica da casa. Raramente chega a sobrar alguma coisa, quando encerramos estes contratos.

A garantia contratual (Lei 8.666/93, art. 56) visa resguardar a Administração de problemas relacionados ao contrato, tipicamente recolhimento de multas, alguma sentença judicial, encerramento de contratos etc. Dentre as três modalidades (depósito de dinheiro em caução, carta fiança ou seguro garantia), a “meta” é uma só: quando o contrato acabar, constatadas a integral quitação das obrigações, a devolução do dinheiro. E somente neste caso o recurso volta para a contratada.

O que o art. 65 da IN 5/2017 prevê é o pagamento direto utilizando a hipótese do inciso II, que é o recurso da retenção de faturas:

Parágrafo único. Na hipótese prevista no inciso II do caput , não havendo quitação das obrigações por parte da contratada no prazo de quinze dias, a contratante poderá efetuar o pagamento das obrigações diretamente aos empregados da contratada que tenham participado da execução dos serviços objeto do contrato. (grifo meu)

São poucas as hipóteses em que é cabível reter o pagamento de fatura. Uma delas é quando não está comprovada o pagamento de salários, benefícios ou recolhimento de contribuição previdenciária. Há uma polêmica sobre o FGTS, mas entendo do ponto de vista mais restrito, que é o de que só se pode reter aquilo que tem uma proteção constitucional, que é o caso das contribuições previdenciárias.

Quando você abre um processo de contratação e lá colocou critérios de habilitação econômico-financeira, tenho uma dúvida (e nisto gostaria do apoio dos colegas nelquianos), mas acho razoável que ela também tenha que ser mantida ao longo de todo o contrato. Afinal de contas, pensemos: uma empresa me comprova que tem condições financeiras adequadas para levar o contrato até o fim, tem saúde financeira. Está firmando mais um contrato com a administração pública, no qual previu adequadamente despesas, provisões e inclusive lucro. Não faz sentido que, de uma hora para a outra ela mude a estratégia e comece a correr riscos desnecessários e deteriorar aquelas condições apresentadas quando da licitação.
Aí que vemos a questão prática. Hoje em dia tem muita laranja podre em licitação e muita empresa desesperada que, para concorrer e conseguir levar algum contrato, tem que jogar as margens em níveis inexequíveis, ou lucrativos apenas se tudo der certo: os empregados não são demitidos sem justa causa, ninguém fica doente, quiçá a fiscalização é omissa e não sofre glosas e/ou penalidades de alguma execução imperfeita.
Volto à questão da qualificação econômico-financeira. Quando o TCU solta o Acórdão 1214/2013 (que deveria ser leitura obrigatória não para todo o gestor, mas TODO o servidor público que algum dia sequer pense em trabalhar com algo relacionado à fiscalização e/ou gestão de contratos), ele bate numa tecla que o capital circulante líquido (CCL) deve ser de, no mínimo, 16,66% do valor estimado para a contratação. Este número não é à toa. Significa que uma empresa tem que aguentar passar duas competências sem a quitação das faturas pelo órgão público sem qualquer prejuízo aos seus funcionários e ao bom andamento dos serviços (na verdade, o prazo é um pouco maior, graças à supremacia do interesse publico). E sim, em tese, há uma divergência em relação à IN, posto que faturas de até R$ 17.600,00 devem ser quitadas em até cinco dias úteis, a contar da apresentação; e nos demais casos, em trinta dias.

O fato é que janeiro inicia a “safra” de quebradeira de empresas, quando tem que arcar com o 13o e, muitas vezes, sofrem problemas de fluxo de caixa de alguns entes públicos (especialmente se for o primeiro ano de mandato).

O que lhe cabe fazer é notificar a empresa que a garantia não se destina a isto. Que ela deve providenciar outros meios para quitar a obrigação e, em havendo o atraso nos salários, é cabível a abertura de procedimento para aplicação de penalidade e que pode resultar na rescisão contratual. Aliás, é muito recomendável que isto já se inicie assim que se confirme um eventual atraso de salários, sob pena de ser condenada subsidiariamente, por culpa in vigilando, não fiscalizando adequadamente o contrato. Se a Administração atrasou faturas de forma que complicou a situação financeira dela, pode até ser um atenuante na sanção, não necessariamente o é, posto que o problema tende a ser de gestão.

Caso a empresa REALMENTE não tenha recursos, nem consiga honrar as obrigações, é cabível reter as faturas e aí realizar o pagamento direto dos salários, estourado o prazo de quinze dias. Ou, em havendo fatura a ser paga, realizar o pagamento direto dos salários e, em havendo saldo, repassar à contratada após a quitação das verbas trabalhistas.

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Sim, o contratado deve manter todas as condições de habilitação durante o contrato, incluindo CCL e PL proporcional aos compromissos. Essa, em geral, é uma regra pouca observada na gestão contratual.

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Obrigado!
Precisava desta informação para alguns contratos!

Perfeita explicação! Posso dizer porque passamos várias vezes por situações semelhantes.