Inabilitação na fase de credenciamento

Prezados, é legal a desclassificação de uma empresa em uma licitação ainda na fase de credenciamento onde seu contrato social não contém atividade correlata ao objeto do certame ?

Gustavo, a situação depende muito do caso concreto e seus detalhes.

É importante saber que em vários casos o TCU considerou válida a participação de empresa que comprovou pertencer ao RAMO de atividade da licitação. Vejamos como isso foi interpretado.

No Brasil, as empresas podem explorar qualquer atividade que não seja expressamente ilícita (art. 170 da Constituição).

Não há, na Lei de Licitações, exigência explícita de que o objeto social da empresa contemple exatamente o objeto licitado. Exige-se somente que a empresa demonstre estar devidamente cadastrada na esfera pertinente (Municipal, se prestador de serviços; Estadual, se comércio). Isso é qualificação jurídica.

O que a Lei exige é a comprovação, quando necessário, de que o particular tem condições efetivas de entregar ou executar o que está sendo licitado. Isso já é qualificação técnico-operacional.

Segundo uma resposta da Consultoria Zênite,

"De acordo com o ordenamento jurídico brasileiro, os atos praticados fora dos limites do objeto social, mas em conformidade com o RAMO da atividade desenvolvida pela pessoa jurídica, não são considerados inválidos.

Caso um determinado licitante apresente contrato cujo objeto social não mencione exatamente aquele pretendido pela Administração, ele pode ser considerado habilitado, desde que as atividades por ele desenvolvidas sejam pertinentes com as finalidades descritas no ato constitutivo."

Vejamos um caso concreto. Na Decisão 756/97, o TCU estava julgando um Convite para manutenção de cadeiras e estofados. A empresa vencedora não tinha no contrato social E nem executava na prática, atividade compatível com o serviço licitado. O TCU entendeu que “por mais extensiva que seja nossa interpretação”, a empresa não era do ramo. Interessante que o Tribunal determinou que, nesses casos, seja utilizada a faculdade da diligência (§ 3º do art. 43 da Lei nº 8.666/93) “para complementação da instrução de processo de licitação sempre que houver algum indicativo de possível irregularidade na qualificação dos licitantes”.

Perceba que o TCU não estava buscando uma descrição literal do objeto licitado no contrato social da empresa. O que estava em jogo era a comprovação de que a empresa atuava no RAMO pertinente, o que poderia ser evidenciado até com diligência na própria empresa.

Outro caso. No Acórdão 4561/2010-1P, o TCU se viu diante de uma empresa com CNAE (Classificação Nacional de Atividades Econômicas) de “comércio por atacado de peças e acessórios novos para veículos automotores” quando a contratação tratava de"serviços de manutenção em veículos". No Contrato Social constava: “comércio a varejo e prestação de serviço de instalação, substituição e reposição de peças, componentes e acessórios de veículos, bem como exercer todas as atividades conexas, consequentes e complementares”.

O TCU entendeu que estava tudo bem, não apenas porque o Objeto Social contemplava o ramo licitado, mas também porque ao acessar o site da empresa, foi verificada a procedência das informações, ou seja, a empresa atuava mesmo na manutenção de automóveis.

Outro exemplo. Reexame Necessário nº 599042074 da Primeira Câmara de Férias Cível do Tribunal de Justiça do RS. Ementa:

“A inabilitação técnica de empresa por falta de qualificação técnica é restrita às hipóteses do artigo 30 da Lei n 8666/93. O simples fato de o objeto social da empresa não coincidir precisamente com o objeto central da licitação não é motivo suficiente para sua inabilitação."

Agora, um pouco de doutrina. Marçal Justen Filho em Comentários à Lei de Licitações diz que o contrato social não limita a atuação da empresa, que tem personalidade jurídica ilimitada. O objeto social destina-se apenas a produzir efeitos de fiscalização da atividade dos administradores da sociedade. Esse mesmo autor defende que a compatibilidade do objeto social com a coisa licitada se relaciona com qualificação técnica. Se uma pessoa jurídica tem experiência adequada e suficiente, não será a falta de previsão expressa no contrato social um empecilho para sua habilitação.

O próprio Manual de Licitações do TCU ensina que podem participar da licitação quaisquer interessados cujo objeto social especifique RAMO de atividade compatível com o objeto da licitação.

O importante é verificar se o licitante se apresentou para o certame como integrante do RAMO do objeto licitado. Ele tem experiência nisso? Tem condições de atender ao pretendido? Essas são as perguntas relevantes.

Espero ter contribuído.

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Muito boa a resposta!
No caso a empresa não tinha objeto correlato ao certame, sempre aplico esse entendimento que o objeto não precisa ser exatamente o mesmo, mas sim correlata e compatível, mas no meu entendimento no meu caso em questão, a empresa não detinha essa condição.

Obrigado