Elaboração de contrato para serviços de TI; Mão de Obra; UST; Repactuação ou Reajuste por índice?

Estamos elaborando um edital e contrato para serviços de desenvolvimento de softwares sob demanda. Medição dos serviços será feita por UST. Contrato de execução continuada, com vigência de 30 meses. Na planilha de composição de custos o valor dos salários e encargos corresponde a ~ 94% do valor da UST. Portanto há predominância de mão de obra nessa matriz de custo. Pergunto: neste caso posso implementar cláusula de Repactuação no contrato? Ou os serviços de TI precisam ser reajustados por índice setorial como o Índice de Custos de Tecnologia da Informação - ICTI?

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@Joao_Borges_Queiroz,

A obrigatoriedade de reajuste por índice setorial foi definida pela Instrução Normativa ME nº 31/2021, que alterou a Instrução Normativa SGD/ME n° 01/2019:

Art. 24. Nas contratações de serviços de Tecnologia da Informação em que haja previsão de reajuste de preços por aplicação de índice de correção monetária, é obrigatória a adoção do Índice de Custos de Tecnologia da Informação - ICTI, instituído pela Portaria GM/MP nº 424, de 7 de dezembro de 2017, e mantido pela Fundação Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada - IPEA. (Alterado pela Instrução Normativa nº 31, de 23 de março de 2021)

No entanto, essa é uma norma que disciplina órgãos e entidades integrantes do Sistema de Administração dos Recursos de Tecnologia da Informação - SISP do Poder Executivo Federal. Disciplina esta que não tem mais previsão para contratos de desenvolvimento e manutenção de software usando Unidade de Serviço Técnico - UST, conforme Portaria SGD/ME nº 5.651/2022:

Art. 5º O modelo de contratação de serviços de desenvolvimento, manutenção e sustentação de software admite, em uma mesma contratação ou em diferentes contratações, a adoção de uma ou mais modalidades padronizadas de remuneração, entre as descritas a seguir:

I - Para serviços de desenvolvimento e/ou manutenção, o Pagamento aferido por Pontos de Função e complementado por Horas de Serviço Técnico, vinculado ao alcance de resultados e ao atendimento de níveis mínimos de serviço;

II - Para serviços de desenvolvimento e/ou manutenção, o Pagamento de valor fixo por sprint executada, vinculado a níveis mínimos de serviço;

III - Para serviços de desenvolvimento e/ou manutenção e/ou sustentação, o Pagamento por alocação de profissionais de TI, vinculado ao alcance de resultados e ao atendimento de níveis mínimos de serviço;

IV - Para serviços de sustentação, o Pagamento de valor fixo mensal por portfólio de softwares, vinculado ao atendimento de níveis mínimos de serviço.

Ainda que exista orientação sobre a possibilidade de contratação por UST, a última atualização é de 06/06/2022, enquanto a portaria supra é de 28/06/2022, com vigência a partir de 1° de agosto de 2022.

Sendo assim, considerando a disciplina do SISP, os serviços de TI para desenvolvimento e manutenção de software, que forem reajustados usando índice de correção monetária, devem obrigatoriamente adotar o Índice de Custos de Tecnologia da Informação - ICTI, conforme Art. 24 da IN 01/2019, mas não devem usar a métrica de Unidade de Serviço Técnico, já que não foi um dos modelos de contratação previstos na Portaria 5.651/2022.

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Na verdade, @DiegoFGarcia, a referida IN diz claramente que ela se aplica para os casos de “contratações de serviços de Tecnologia da Informação em que haja previsão de reajuste de preços por aplicação de índice de correção monetária”.

Ela não diz que obrigatoriamente tem que prever reajuste por índice, e sim que se prever, obrigatoriamente tem que usar o ICTI.

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@ronaldocorrea,

Exatamente, é como você disse… Se for reajustar por índice de correção monetária, tem que ser o ICTI. Fiz o edite para ficar mais claro.

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Caros João e demais colegas,

Também tenho muitas dúvidas sobre esse tema.

Acrescento, da forma mais resumida possível, alguns pontos aos comentários já feitos por outros colegas.

  1. UST
    =====
    A UST tem sido bastante questionada pelo TCU nos últimos anos, como ocorreu nos Acórdãos 916/2015, 2.037/2019, 915/2020, 423/2020 e 1.508/2020, todos do Plenário do TCU.

A intenção era boa (começou na TIControle e no STJ), mas essa “métrica” de contratar serviços de TI apresentava, desde sua concepção, muitos riscos, que se materializaram ao longo do tempo. Adicionalmente, foi muito distorcida em diversas contratações.

No excerto do resumo do relatório de fiscalização que consta do Acórdão 1.508/2020-TCU-Plenário, instruído pela Sefti, cujo relator é o Ministro-Substituto André de Carvalho, consta o seguinte:
"40. A partir da análise da amostra de contratações baseadas na adoção da nomenclatura UST, constatou-se que as metodologias aplicadas apresentam, em suas essências, incomparabilidade entre preços, tendo em vista os seguintes motivos:

40.1. por a UST não se tratar de uma unidade de medida padronizada, que apresenta concretude no mundo real, de modo a permitir a comparabilidade e a precificação em razão de características similares, como, exemplificativamente, as unidades metro, quilo, litro, que permitem comparações entre objetos que pertencem à mesma categoria;

40.2. em decorrência do ineditismo de cada metodologia em relação às precedentes, gerando um cenário de alta heterogeneidade, pois percebe-se que há a tendência de cada contratação ser única para cada organização, sem análogas que sirvam para comparação, considerando que a metodologia adotada em cada uma é específica para uma determinada estrutura organizacional;

40.3. em razão das possíveis distorções que podem haver em razão da falta de balanceamento de seus parâmetros, caso não se utilize a planilha de formação de preços; e

40.4. porque para haver possibilidade de comparação entre os preços de UST de organizações diferentes, seria necessário que os TR contivessem exatamente as mesmas condições de contratação, que os catálogos possuíssem exatamente os mesmos serviços, com esforços e complexidades iguais ou muito similares, dimensionados da mesma maneira e que as organizações possuíssem a mesma estrutura. Heterogeneidade das contratações públicas que utilizam a prática UST".

Portanto, de acordo com o exposto nesta minha mensagem, somando-se ao que foi colocado pelos colegas nas suas respectivas mensagens, o uso de UST é extremamente arriscado, tanto em termos de não se alcançar um contrato eficaz e econômico quanto de responsabilização dos gestores, pois há alto risco de sobrepreço e superfaturamento decorrente do sobrepreço.

  1. Repactuação X uso de índice de reajuste
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    Esse tema envolve diversos conceitos como: serviços contínuos, serviços com mão de obra exclusiva ou predominância de mão de obra, prorrogação-renovação, necessidade de pesquisas de preço nas prorrogações-renovações, reajuste no sentido estrito, índices oficiais de reajuste, repactuação, planilha de custos e formação de preços (PCFP), entre outros.

O conceito de “prorrogação-renovação” foi exposto por Marçal Justen Filho em artigo, diferenciando do conceito de “prorrogação-ampliação do prazo”.
O título do artigo é “Prorrogação contratual: a propósito da Lei 13.448/2017. Diferenças entre “prorrogação-renovação” e “prorrogação-ampliação do prazo”.
O artigo pode ser obtido no link a seguir: http://justenfilho.com.br/artigos/jota-“prorrogacao-contratual”-a-proposito-da-lei-134482017-diferencas-entre-“prorrogacao-renovacao”-e-“prorrogacao-ampliacao-do-prazo”/

A questão da repactuação está muito ligada à questão da necessidade de pesquisa de preço na prorrogação-renovação.
Por isso vou tratar desse tema ao longo desta mensagem.

Inicialmente, vale trazer o item 9.1.17 do Acórdão 1.214/2013-TCU-Plenário, da relatoria do Ministro Aroldo Cedraz, ainda sob a égide da Lei 8.666/1993:
"9.1.17 a vantajosidade econômica para a prorrogação dos contratos de serviço continuado estará assegurada, dispensando a realização de pesquisa de mercado, quando:

9.1.17.1 houver previsão contratual de que os reajustes dos itens envolvendo a folha de salários serão efetuados com base em convenção, acordo coletivo de trabalho ou em decorrência da lei;

9.1.17.2 houver previsão contratual de que os reajustes dos itens envolvendo insumos (exceto quanto a obrigações decorrentes de acordo ou convenção coletiva de trabalho e de Lei) e materiais serão efetuados com base em índices oficiais, previamente definidos no contrato, que guardem a maior correlação possível com o segmento econômico em que estejam inseridos tais insumos ou materiais;

9.1.17.3 no caso de serviços continuados de limpeza, conservação, higienização e de vigilância, os valores de contratação ao longo do tempo e a cada prorrogação forem inferiores aos limites estabelecidos em ato normativo da Secretaria de Logística e Tecnologia da Informação do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão - SLTI/MP. Se os valores forem superiores aos fixados pela SLTI/MP, caberá negociação objetivando a redução dos preços de modo a viabilizar economicamente as prorrogações de contrato;".

O item do acórdão transcrito tratou de simplificação dos procedimentos de prorrogação de contratos.

Depreendo do item transcrito e da argumentação trazida no relatório do acórdão citado que, no escopo das prorrogações-renovações das contratações de serviços contínuos, inclusive os de TI, a manutenção da vantajosidade, chamada de “vantajosidade econômica” no acórdão, está assegurada, dispensando-se a realização de pesquisas de mercado, que neste caso se refere à pesquisa de preços, quando forem previstos no contrato:

  1. reajustes para os itens envolvendo a folha de salários, com base em convenção, acordo coletivo de trabalho ou em decorrência da lei, que, na prática, funciona como um conjunto de índices de reajuste para as respectivas categorias; e

  2. reajustes para os itens envolvendo insumos (exceto quanto a obrigações decorrentes de acordo ou convenção coletiva de trabalho e de Lei) e materiais com base em índices oficiais, previamente definidos no contrato, que guardem a maior correlação possível com o segmento econômico em que estejam inseridos tais insumos ou materiais.

A Lei 14.133/2021, no art. 6º (definições), traz os conceitos de “reajustamento em sentido estrito” e “repactuação”.
Na lei citada, ainda é explicitado que o “reajustamento em sentido estrito” se aplica a serviços contínuos em que não haja regime de dedicação exclusiva de mão de obra ou predominância de mão de obra (art. 25, § 8º, inciso I, e art. 92, § 4º, inciso I).

Na Lei 14.133/2021 também é explicitado que a “repactuação” se aplica a serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra ou predominância de mão de obra, como consta no art. 6º, inciso LIX, e no art. 25, § 8º, inciso II, e art. 92, § 4º, inciso II

Pode-se inferir inicialmente que, de acordo com a Lei 14.133/2021, para os contratos de serviços contínuos com regime de dedicação exclusiva de mão de obra ou predominância de mão de obra, seria sempre necessário efetuar pesquisa de preços, com base na PCFP (art. 135, § 6º), de modo a viabilizar a análise da variação dos custos contratuais referentes aos custos decorrentes do mercado.

Entretanto, a análise da variação dos custos relativos à parcela relativa à mão de obra normalmente se baseia na convenção coletiva ou ao dissídio coletivo das categorias envolvidas, que, como foi exposto, termina funcionado como uma fonte de índices de reajuste para essa parcela dos custos, embora a Lei 14.133/2021 considere essa atualização de valores como repactuação com demonstração analítica dos custos por meio de apresentação do novo acordo coletivo, convenção ou sentença normativa que fundamenta a repactuação (art. 135, § 6º).

Portanto, levando-se em conta:

  1. o entendimento contido no item 9.1.17 do Acórdão 1.214/2013-TCU-Plenário, no sentido de assegurar a vantajosidade econômica nas prorrogações-renovações dos contratos de serviços contínuos sem a realização de pesquisa de mercado em determinadas circunstância, ou seja, sem repactuação; e
  2. os conceitos de “reajustamento em sentido estrito” e de “repactuação” positivados na Lei 14.133/2021;
    pode-se concluir que a necessidade de haver pesquisas de preços ao longo da gestão contratual depende da natureza do serviço contínuo (se houver ou não regime de dedicação exclusiva de mão de obra ou predominância de mão de obra), de haver índice de correção que retrate a variação efetiva do custo de produção e de haver convenção coletiva das categorias envolvidas.

No melhor caso, se for um contrato de serviço de TI com mão de obra exclusiva, se houver índice de reajuste para materiais e serviços (ICTI?) e se houver acordo coletivo para as categorias envolvidas, em tese, não há necessidade da repactuação no sentido estrito, pois bastaria aplicar o acordo coletivo para as categorias de funcionários e o índice de reajuste para os materiais e serviços.

Vale lembrar que o ICTI também inclui mão de obra na sua composição.

Portanto, para serviços contínuos sem mão de obra exclusiva ou com predominância de mão de obra (e.g. contratação de links de comunicação), o reajuste pelo ICTI parece adequado.

Entretanto, no caso de serviços contínuos com alocação exclusiva de mão de obra ou com predominância de mão de obra, parte da dúvida colocada incialmente persiste: deve-se usar o acordo coletivo, que funciona como índice de reajuste, ou o ICTI, que inclui mão de obra na sua composição?
No escopo da Lei 14.133/2021, parece ser mais adequado aplicar o acordo coletivo das categorias envolvidas.

Ressaltando que, para serviços contínuos com alocação exclusiva de mão de obra ou predominância de mão de obra em que não haja alguma métrica consagrada, o TCU tem recomendado a necessidade de PCFP e uso da análise de fator-K (vide Acórdãos 1.508/2020 e 2.037/2019, ambos do Plenário do TCU).

Enfim, talvez eu tenha trazido mais “minhocas para a cabeça” do que respostas.

Não é um assunto simples, pelo menos para mim, e ainda há mais detalhes, mas não quis deixar a mensagem mais comprida do que ficou.

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