Como definir o percentual (de até 10%) para comprovação de patrimônio líquido mínimo

Prezados(as), boa tarde.

Primeiramente, peço desculpas se este tema já foi discutido aqui.

Sobre a exigência a seguir:

“As empresas, que apresentarem resultado inferior ou igual a 1(um) em qualquer dos índices de Liquidez Geral (LG), Solvência Geral (SG) e Liquidez Corrente (LC), deverão comprovar patrimônio líquido de …(…) do valor total estimado da contratação ou do item pertinente.”

E em função das notas explicativas abaixo:

“Nota explicativa 1: A fixação do percentual referente ao patrimônio líquido se insere na esfera de atuação discricionária da Administração até o limite legal de 10% (dez por cento) do valor estimado da contratação (art. 31, § 3º da Lei nº 8.666, de 1993).
Nota Explicativa 2: De acordo com o art. 24 da Instrução Normativa SEGES/MPDG nº 03/2018, deve-se fixar percentual proporcional aos riscos que a inexecução total ou parcial do contrato poderá acarretar para a Administração, considerando-se, entre outros fatores, o valor do contrato, a essencialidade do objeto, o tempo de duração do contrato.
A sondagem do mercado se afigura importante, a fim de obter dados sobre o porte das empresas que atuam na área objeto da contratação. Ressalte-se que, se o referido percentual for fixado em seu mais alto patamar e o valor total estimado da contratação também for significativo, trará como consequência a necessidade de comprovação de patrimônio líquido elevado, o que poderá resultar na restrição à participação de interessados no certame, em especial, de microempresas ou empresas de pequeno porte, podendo ferir o princípio constitucional de incentivo a essas unidades empresariais. Por essa razão, é indispensável avaliação técnica sobre o assunto. Caso feita a exigência de capital ou patrimônio líquido mínimo, fica vedada a exigência simultânea de garantia da proposta (art. 31, III, da Lei n° 8.666/93), conforme interpretação do § 2° do mesmo dispositivo”

Que parâmetros utilizar para definir o percentual (de até 10%) para comprovação de patrimônio líquido mínimo??? Como justificar???

Obrigado.

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Eu faço baseado no balanço mesmo, dividindo o patrimônio liquido pelo valor da contratação e aviso ao ardenador de despesa para avaliar o risco da contratação, já que a norma diz que ele é quem decide.

Bruno, falo sobre isso no meu livro de Fraudes em Licitação (cuja terceira edição, com o dobro de conteúdo, sai agora em setembro):

Considerando o regulamento do SICAF, Sistema de Cadastro de Fornecedores do Governo Federal e a lógica da racionalidade dos controles, deve-se fixar percentual mínimo de Capital Social ou Patrimônio Líquido proporcional aos riscos. Os riscos principais, nesse caso, são: (1) inexecução ou falha no contrato; e (2) restrição indevida à competição. Essa ponderação deve considerar, entre outros fatores, o valor estimado do contrato, a essencialidade do objeto, o tempo de duração do contrato, as caraterísticas do mercado fornecedor em potencial. Espera-se justificativa nos autos e estudo de mercado com vistas a verificar o potencial restritivo (Acórdão
TCU nº 1.321/2020-P)

Na prática, imensa maioria dos editais adota os 10%. A coisa começa a complicar em licitações de vulto expressivo, como aconteceu no caso tratado no Acórdão 1321/2020-P. Imagina licitar 10 milhões. O PL tem que ser de 1 milhão. Será que há muitas empresas com esse calibre?

Agora imagina licitar 100 milhões. Quem tem PL de 10 milhões? Quantos atenderiam esse critério? Já vi editais de 800 milhões (contrato de vários anos) exigir os tais 10%…

Outro fator é o prazo e modo contratual. Uma coisa é contrato por escopo, tem início, meio e fim especificados. Outra é contrato continuado, cujo serviço se repete ano após ano.

Nesse segundo caso, por exemplo, um edital de limpeza, que já começa em 3 anos. Os critérios de capacidade econômica, pela jurisprudência do TCU, devem ser proporcionais a 12 meses e não a 36 (vigência inicial).

Em síntese, conforme aumenta o valor licitado e/ou o prazo e/ou escopo, aumentam os riscos, e com isso aumenta a relevância de estudos mais sofisticados.

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Obrigado, Adriano e Franklin.

Prezado Franklin, boa tarde!

Você poderia, por imensa gentileza, me informar qual acórdão do TCU/jurisprudência consta a seguinte diretriz: ‘‘Nesse segundo caso, por exemplo, um edital de limpeza, que já começa em 3 anos. Os critérios de capacidade econômica, pela jurisprudência do TCU, devem ser proporcionais a 12 meses e não a 36 (vigência inicial).’’

Desde já, agradeço pelo retorno e pelos esclarecimentos.

Oi, Andre. Esse entendimento foi exarado no Acórdão 1335/2010-Plenário, de que o requisito de qualificação econômico-financeira deve pautar-se sobre o valor estimado para o período de 12 (doze) meses, mesmo quando o prazo do contrato for superior a este período.

9.2.1. faça incidir o valor de capital social mínimo ou patrimônio líquido mínimo exigido como requisito de qualificação econômico-financeira sobre o valor estimado para o período de 12 (doze) meses, mesmo quando o prazo do contrato for superior a este período, nos termos dos §§ 3° e 5º do art. 31 da Lei nº 8.666/1993;

Essa lógica tem a ver com o fato de que a vigência inicial superior a 12 meses não deve afetar, em tese, o requisito de habilitação econômico-financeira mínima.
Observemos, por exemplo, o Capital Circulante Líquido.
A origem desse requisito nas contratações federais remonta ao Acórdão 1214/2013-P, o qual trata o CCL mínimo como o suficiente para “honrar no mínimo 2 (dois) meses de contratação sem depender do pagamento por parte do contratante”. Então, a base correta para esse requisito não é o valor estimado da contratação, quando o contrato prevê mais de 12 meses de vigência inicial. O correto, nesse caso, será exigir o CCL correspondente a 16,66% do valor estimado relativo a 12 meses de execução contratual.

Assim foi realizado no Pregão 64/2015 do próprio TCU, que licitou limpeza por 30 meses. Tanto CCL quanto Patrimônio Líquido foram previstos em relação ao valor anual:

35.2 Capital Circulante Líquido (CCL) ou Capital de Giro (Ativo Circulante – Passivo Circulante) de, no mínimo, 16,66% (dezesseis inteiros e sessenta e seis centésimos por cento) do valor anual estimado para a contratação;

35.3 Patrimônio Líquido igual ou superior a 10% (dez por cento) do valor anual estimado para a contratação.

A Lei 14.133/2021, a Nova Lei de Compras Públicas, já trouxe esse entendimento para a garantia contratual e para os limites da LCP 123.

Art. 4. Aplicam-se às licitações e contratos disciplinados por esta Lei as disposições constantes dos arts. 42 a 49 da Lei Complementar nº 123, de 14 de dezembro de 2006.

§ 3º Nas contratações com prazo de vigência superior a 1 (um) ano, será considerado o valor anual do contrato na aplicação dos limites previstos nos §§ 1º e 2º deste artigo.

Art. 98. Nas contratações de obras, serviços e fornecimentos, a garantia poderá ser de até 5% (cinco por cento) do valor inicial do contrato, autorizada a majoração desse percentual para até 10% (dez por cento), desde que justificada mediante análise da complexidade técnica e dos riscos envolvidos.

Parágrafo único. Nas contratações de serviços e fornecimentos contínuos com vigência superior a 1 (um) ano, assim como nas subsequentes prorrogações, será utilizado o valor anual do contrato para definição e aplicação dos percentuais previstos no caput deste artigo.

Se para Garantia contratual e para os limites da LC 123 foi previsto o valor anual como parâmetro, a lógica parece apontar que os demais requisitos de habilitação acompanhem esse mesmo racional.

Sintetizando, defendo que em licitações de serviços continuados com vigência inicial superior a 12 meses, os requisitos de qualificação econômico-financeira sejam adotados com base no valor anual estimado.

Franklin Brasil
Autor de Como Combater o Desperdício no Setor Público

Autor de Como Combater a Corrupção em Licitações

Autor de Preço de referência em compras públicas

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