Capacitação - Autoridade Local é parte interessada

Caríssimos, solicito sua ajuda.

Estamos para contratar uma capacitação, da qual nosso Ordenador de Despesas é parte interessada. Eu e a substituta dele temos o entendimento, com base nos arts. 18, I, e 19 da Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999, e alterações posteriores, que quem autoriza é a autoridade acima dele. Fui dizer isso a ele e ele insiste em dizer que sua substituta pode autorizar. Ela não quer se envolver.

O argumento dele procede ou é o nosso entendimento que está correto?

Desde já, agradeço a vocês!

Afonso,

Se ele é a autoridade máxima, de fato não deve aprovar a própria despesa.

Mas o substituto aprovando eu entendo que supre a necessária segregação de funções e afasta qualquer conflito de interesse.

Na CGU, por exemplo, todo afastamento do Ministro a serviço (ou seja, pagamento de diárias e passagens) é autorizado pelo Secretário-Executivo, que é o seu substituto, e não pelo Presidente da República, que é a autoridade hierarquicamente superior.

Se a competência para ordenar despesas decorre de atribuição de cargo ou função comissionado, não há que se falar em atuação do substituto se o titular não está afastado ou impedido de exercer suas atribuições.

E quanto a isso, nos atemos ao teor do Ofício nº 146/2005/COGES/SRH/MP, explica o que seria “afastamento, impedimento legal ou regulamentar para efeito de substituição”:

Pode-se considerar afastamento, impedimento legal ou regulamentar para efeito de substituição, aqueles previstos na Lei nº 8.112, de 1990, a seguir discriminados:
a) Art. 77 – férias;
b) Art. 95 – afastamento para estudo ou missão no exterior, conforme regulamento contido no Decreto nº 2.794, de 1998;
c) Art. 97 – ausências do serviço para doar sangue (um dia); alistamento eleitoral (dois dias); casamento, falecimento do cônjuge, companheiro, pais, madrasta ou padrasto, filhos, enteados, menor sob guarda ou tutela e irmãos (oito dias consecutivos);
d) Art. 102 – participação em programa de treinamento regularmente instituído, conforme disposto no Decreto nº 2.794, de 1998; júri e outros serviços obrigatórios previstos em lei; licença à gestante, à adotante e à paternidade; para tratamento da própria saúde; por motivo de acidente em serviço ou doença profissional;
e) Art. 147 – afastamento preventivo (até sessenta dias, prorrogável por igual período); e
f) Art. 149 – participar de comissão de sindicância (trinta dias, prorrogável por igual período); processo administrativo disciplinar ou de inquérito (sessenta dias, prorrogável por igual período).

Ainda nesse assunto, cito a Nota Técnica nº 253/2011/CGNOR/DENOP/SRH/MP:

  1. Assim, o próprio estatuto dos servidores públicos já estabelece a forma como a Administração deverá agir nas ausências, impedimentos legais ou regulamentares do titular do cargo ou função de direção ou chefia e os ocupantes de cargo de Natureza Especial ou, na vacância destes cargos, deverá haver a indicação de um servidor para substituí-lo.

  2. Destaque-se que o substituto estará investido nas atribuições do cargo em comissão ou de Natureza Especial enquanto o titular não puder exercê-las, em vistas das situações relacionadas no parágrafo anterior, ou seja, o substituto somente poderá estar investido nas atribuições de tal cargo quando o titular não as estiver exercendo. (…)

E a coisa vai mais longe, conforme Nota Técnica nº 8/2013/CGNOR/DENOP/SEGEP/MP:

  1. (…) essencial a análise pelos órgãos setoriais do SIPEC se o afastamento do titular geraria, de fato, a necessidade de substituição. Nos casos em que o titular, mesmo fora de sua sede, exerça suas atividades sem qualquer prejuízo, a substituição restaria prescindível e, por conseguinte, não seria devido seu pagamento, exceto no caso de ausência do território nacional, em que a substituição é automática, em face do contido no Decreto nº 6.532, de 2008.

Essas informações foram tiradas de um parecer da consultoria jurídica do ministério que atuo. Por fim, tem também a análise da Nota Técnica nº 253/2011/CGNOR/DENOP/SRH/MP:

  1. Reforçando este entendimento, devemos observar, ainda, o que preceitua a Lei nº 8.112, de 1990, quanto à possibilidade de se atribuir competência a outros servidores:
    Art. 117. Ao servidor é proibido:
    (…)
    XVII - cometer a outro servidor atribuições estranhas ao cargo que ocupa, exceto em situações de emergência e transitórias;

  2. Destaque-se que a ressalva estabelecida deverá ser analisada restritivamente, sendo aquelas situações que fogem ao planejamento prévio da Administração e que podem ensejar graves prejuízos à realização dos serviços.

  3. As ausências do titular do cargo em comissão e do seu substituto, portanto, não autorizam o Administrador Público a utilizar-se das figuras denominadas ‘responsável pelo expediente’ ou ‘substituto interino’ e suas variações, uma vez que não possuem respaldo em nosso ordenamento jurídico.

Arthur,

Não se trata de exercer as atribuições do titular do cargo, mas sim atuar como substituto na função de Ordenador de Despesas, cuja designação é específica e distinta da designação para ocupar o cargo comissionado. A função de Ordenador de Despesas não decorre do cargo comissionado em si, mas sim do instrumento formal e específico de designação. Não faz parte da descrição do cargo comissionado ser Ordenador de Despesas, por mais que possa existir designação específica para que o ocupante do cargo comissionado seja o OD. Mas isto não muda as atribuições originárias do cargo comissionado.

Assim, não se aplicam as regras de substituição de cargo comissionado, já que a função de Ordenador de Despesa não é um cargo comissionado.

Ronaldo,

Em geral a competência para praticar atos que resultem em “emissão de empenho, autorização de pagamento, suprimento ou dispêndio de recursos” são dos chefes dos poderes, ministros de estados, dirigentes de Autarquias etc.

Em geral, essas autoridades delegam essas funções para ordenadores de despesas secundários. Se no instrumento de delegação atribuir essa competência a um determinado titular de uma cargo ou função comissionada (Coordenador-Geral, Coordenador, Superintendente), o substituto só atua na função se houver afastamento, impedimento legal ou regulamentar.

Agora se esse titular subdelega a função a uma terceira pessoa, então a pessoa atuará nos limites dessa subdelegação.

Ausente instrumento de subdelegação, se o instrumento de delegação atribuiu ao titular do cargo ou função comissionada a função de ordenador, o substituto não pode assumir essa função, pois ele não está no exercício do cargo ou função comissionada, que é a condição do instrumento de delegação.

Claro que tudo depende de como é feita a delegação.

Agora na minha visão pessoal, a interpretação do Ofício nº 146/2005/COGES/SRH/MP para “afastamento, impedimento legal ou regulamentar” na verdade considera só os afastamentos. Os impedimentos do art. 18 da Lei 9.784/1999 deveriam ser considerados nesse contexto.

Não dá para, convenientemente, criar dois pesos e duas medidas (quando tem pagamento e quando não tem) para o que seria “afastamento, impedimento legal ou regulamentar”, a não que o instrumento de delegação expressamente o faça.

Enfim, esse tipo de matéria não está sedimentada e rotineiramente autoridades estão por aí praticando atos dos quais não tem competência e isso não traz qualquer consequência. Às vezes se os responsáveis submetessem essas situações mais vezes à consultoria jurídica, que é um órgão que tem atribuição específica para esclarecer, teríamos posicionamentos mais homogêneos.

No âmbito do SIPEC, a competência para fixar a interpretação de norma de pessoal é da SGD/ME, não da consultoria jurídica.

Mas como se trata de organização interna do órgão, isso normalmente é resolvido “em casa”.

A competência da Secretaria de Gestão e Desempenho de Pessoal - SGP para fixar a interpretação da norma de pessoal não afasta a competência da Advocacia-Geral da União - AGU definida na Lei Complementar nº 73/1993.

Agora sobre a questão da organização da “casa”, tenho uma visão um pouco diferente, mas acho que não vem ao caso. Hehehe

Ronaldo e Arthur,

Muitíssimo obrigado pelas informações e considerações. Graças à ajuda de vocês vou poder concluir o trabalho.

Grande abraço!

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