Alteração de planilha de custos durante a execução contratual

Prezados, boa tarde!

Tenho a situação de um contrato de prestação de serviços continuados, já em execução, no qual identificamos que um dos itens de custo (hora intervalar), apesar de constante da planilha apresentada pela empresa, em verdade não está sendo pago pela empresa aos seus contratados.

Inicialmente, questionamos a empresa acerca do não pagamento desses valores e, confirmada tal situação, sinalizamos à empresa a necessidade de ajuste (redução) do valor do contrato através da eliminação desse item de custo que na realidade não existe.

A empresa, então, alegou que a inclusão de tal item em sua planilha de custos havia decorrido de erro de preenchimento e que, no seu entendimento, haja vista haver vencido a licitação e, portanto, haver apresentado proposta inferior aos concorrentes, deveria ter o direito de redistribuir o valor em questão pelos outros itens de custo da planilha, da mesma maneira que teria feito se o erro tivesse sido identificado durante a fase de apresentação da proposta no pregão eletrônico.

Neste ponto surge a questão: a esta etapa dos acontecimentos (ou seja, encerrada a licitação, assinado o contrato e iniciada a execução contratual), caberia efetuar ajuste de erros de preenchimento na planilha, ainda que não haja majoração do valor global do contrato ?

Márcio

Márcio,

Não sei qual é o órgão contratante, mas se for o caso de órgão do SISG regido pela IN 5/2017-SEGES/MP, vale o que fixa a norma operacional do SISG.

Art. 30. O Termo de Referência ou Projeto Básico deve conter, no mínimo, o seguinte conteúdo:
VII - critérios de medição e pagamento;

Ou seja, o TR deve obrigatoriamente prever como serão medidos e pagos os serviços contratados.

Art. 50, II - o recebimento definitivo pelo gestor do contrato, ato que concretiza o ateste da execução dos serviços, obedecerá às seguintes diretrizes:
c) comunicar a empresa para que emita a Nota Fiscal ou Fatura com o valor exato dimensionado pela fiscalização com base no Instrumento de Medição de Resultado (IMR), observado o Anexo VIII-A ou instrumento substituto, se for o caso.

O próprio faturamento da empresa deve ser feito já com base no resultado do IMR. A medição é obrigatória, portanto.

Art. 63, § 2º Caso o eventual equívoco no dimensionamento dos quantitativos se revele superior às necessidades da contratante, a Administração deverá efetuar o pagamento seguindo estritamente as regras contratuais de faturamento dos serviços demandados e executados, concomitantemente com a realização, se necessário e cabível, de adequação contratual do quantitativo necessário, com base na alínea “b” do inciso I do art. 65 da Lei nº 8.666, de 1993.

Ou seja, o pagamento da empresa deve ser calculado com base no Instrumento de Mediação de Resultados - IMR e não com base na análise da planilha de custos. Ela não se presta a tal finalidade.

Anexo VII-A
7.9. Erros no preenchimento da planilha não são motivos suficientes para a desclassificação da proposta, quando a planilha puder ser ajustada sem a necessidade de majoração do preço ofertado, e desde que se comprove que este é o bastante para arcar com todos os custos da contratação;

O critério de aceitabilidade previsto no Edital não pode a meu ver ser alterado no decorrer da execução do contrato.

Lei 8.666/1993
Art. 41. A Administração não pode descumprir as normas e condições do edital, ao qual se acha estritamente vinculada.

1 curtida

Marcio, entendo que a questão é complexa, e falta elementos para opinar. Explico. Por tratar de direito do trabalhador, envolve direitos trabalhistas, é prudente conversar com o setor de RH da empresa contratada para garantir que o empregado não venha reclamar na justiça a ausencia desse pagamento. Cuidado, o risco do contratante ser solidário existe, então antes de reduzir o valor pense na segurança jurídica, vale a pena ver de novo. Todo contrato administrativo, pode ser revisto na esfera judicial, e aí está o risco de não atender legislação específica e complexa que é a trabalhista. Voce incluisve pode pedir um parecer do setor jurídico. Se ficar confirmado que a empresa não deve pagar a jornada intervalar, ai sim, a despesa é irregular, pois a erário está diminuindo seu patrimonio sem a devida contraprestação. Salvo melhor juízo é o que tenho a colaborar.

1 curtida

Este texto sobre hora intervalar, dentro do enfoque trabalhista, é bem interessante.

O gestor do contrato precisa ser bem diligente para verificar se a hora intervalar está sendo respeitada.

1 curtida

Prezados, muito obrigado pelo retorno.

Pois é, a situação me parece meio complicadinha mesmo. É um componente de custo de caráter trabalhista que, segundo o empregador, não é pago porque não é devido (o contratado efetivamente usufrui integralmente do intervalo de almoço). Entretanto, tal item está lá na planilha de custo. E aí é que suscitam outras questões. Por exemplo: a planilha de custo serve como referência para a elaboração da proposta, proposta essa que foi a vencedora da licitação. Entretanto, o empregador está indicando um custo que na prática não existe e nós estamos pagando por isso. Se estivéssemos na fase de aceitação da proposta e tal questão fosse levantada, a empresa poderia, por exemplo, zerar esse valor da hora intervalar, realocando-o em outro item da planilha. Não haveria alteração no valor do contrato. Neste momento, entretanto, com o pregão encerrado, me parece que tal situação não seria possível, e aí nos restariam apenas duas opções: seguir pagando o contrato de acordo com a planilha atual ou eliminar esse item de custo da planilha (já que ele não existe), reduzindo o valor do contrato.

Marcio, se vc tem evidencias que não é devido, inclusive deve consultar seu setor jurídico, controle jurídico do ato, e definido que não cabe o pagamento do intervalo, então aplique a autotutela, e ponto final.
Vc já pensou duas vezes antes de agir, agora tá na hora de suturar a despesa.

Márcio,

Acredito que o foco está muito em “alterar a planilha”. Você já pensou em fazer a retenção cautelar até apurar o caminho ideal? Faz a retenção cautelar no momento do pagamento, notifica a contratada para apresentar defesa prévia em 5 dias, depois se manifesta e passa para a autoridade competente decidir. Assim você se resguarda enquanto gestor de contrato e o modo ideal é definido pela administração.

Depois nos conte como foi o desenrolar do assunto.

1 curtida

Como estava na planilha do Edital, que serviu de modelo para preenchimento pelo licitante? Tinha a rubrica da intrajornada? Havia alguma previsão nesse sentido?

É polêmica a perseguição de custos efetivos x estimados na execução contratual. Há correntes doutrinárias e jurisprudenciais pra todo gosto.

Já adianto que defendo a mesma posição da empresa. Ela arcaria com erros se tivesse previsto a menor. Então, se previu a maior, lucro dela.

2 curtidas

Então Franklin, se na licitação de uma obra,minha proposta contém uma janela a mais e custa 100.000,00 [hipotético], ganho a licitação e na execução verificasse que não existe a tal janela, mas ganhei a licitação [hipotético]. Aí os 100.000 será lucro da empresa? Previu a maior é lucro dela?
Considere que isso tenha ocorrido [hipoteticamente]

Nesse caso hipotético suprimo a janela (se menor que 25%, senão, lascou), e acrescenta a janela com valor correto (exagerando, acrescenta até a mesma janela suprimida), com o valor de referência adequado e verificando a manutenção do desconto.
Depende também se preço global ou unitário.

Elder,

A empresa ter lucro não é ilegal e não existe norma fixando qual deve ser o percentual “normal” de lucro de uma empresa em mercado não regulados, como é o caso da esmagadora maioria de nossas contratações. Sequer a planilha de composição de custos tem esse condão, já que se trata de artefato meramente instrumental e não constitui por si só a “contabilidade do contrato”, como já amplamente discutido aqui no Nelca nessa década que passamos juntos desde 2009.

Isso tem um peso especial depois da promulgação da Lei da Liberdade Econômica em 2019 que, na minha opinião nada fez além de reforçar o óbvio: A empresa pode vender o produto ou serviço dela no preço que ela quiser, sem que isto caracterize qualquer irregularidade.

Lei 13.874/2019
Art. 1º, § 2º Interpretam-se em favor da liberdade econômica, da boa-fé e do respeito aos contratos, aos investimentos e à propriedade todas as normas de ordenação pública sobre atividades econômicas privadas.

Art. 3º São direitos de toda pessoa, natural ou jurídica, essenciais para o desenvolvimento e o crescimento econômicos do País, observado o disposto no parágrafo único do art. 170 da Constituição Federal.

III - definir livremente, em mercados não regulados, o preço de produtos e de serviços como consequência de alterações da oferta e da demanda;

O que tem que ser feito é uma estimativa correta, por parte da Administração, para fixar o valor máximo que está disposta a pagar. Mas isto de forma alguma pode significar regulação de preços do mercado, e não cabe ficar perquirindo depois os custos reais da empresa para, com base nisto fixar o valor a ser pago a ela.

A IN 5/2017 traz uma regrinha interessante sobre isto, privilegiando a aplicação do mecanismo de medição de RESULTADOS e não de custos, seguindo estritamente as regras contratuais de faturamento como forma de aferir o valor a ser pago à empresa.

IN 5/2017-SEGES/MP
Art. 63, § 2º Caso o eventual equívoco no dimensionamento dos quantitativos se revele superior às necessidades da contratante, a Administração deverá efetuar o pagamento seguindo estritamente as regras contratuais de faturamento dos serviços demandados e executados, concomitantemente com a realização, se necessário e cabível, de adequação contratual do quantitativo necessário, com base na alínea “b” do inciso I do art. 65 da Lei nº 8.666, de 1993.

Inclusive, observe que a extinta IN 2/2008 fixava exatamente isto: se ela cotou algum item de custo acima do “preço de mercado”, estando o valor global dela dentro do limite fixado pela Administração, não há irregularidade alguma em se apropriar isto como lucro dela.

IN 2/2008-SLTI/MP
Art. 23, § 2º Caso a proposta apresente eventual equívoco no dimensionamento dos quantitativos que favoreça a contratada, este será revertido como lucro durante a vigência da contratação, mas poderá ser objeto de negociação para a eventual prorrogação contratual.

Lembrando que a forma de execução denominada Administração Contratada, que previa o mero reembolso de despesas à empresa contratada pagando a ela uma “taxa de lucro” sobre os custos, foi vetada no texto original da Lei 8.666/1993 e não há norma atual permitindo que façamos o uso de tal mecanismo de medição de valor a ser pago à empresa.

Mensagem de Veto nº 335/1993
Razões do veto
A experiência tem demonstrado que a execução indireta, sob o regime de administração contratada, envolve a assunção de elevadíssimos riscos pela Administração, que é obrigada a adotar cuidados extremos de fiscalização, sob pena de incorrer em elevados prejuízos em face do encarecimento final da obra ou serviço.

Como é sabido, nesse regime de execução interessa ao contratado, que se remunera à base de um percentual incidente sobre os custos do que é empregado na obra ou serviço, tornar esses custos o mais elevados possíveis, já que, assim, também os seus ganhos serão maximizados.

Tais dispositivos, portanto, se mostram contrários ao interesse público.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/Mensagem_Veto/anterior_98/Vep335-L8666-93.pdf

1 curtida

Oi, Ivo. Em obra, existem dois regimes de execução por empreitada: preço global e preço unitário. Não confundir com forma de julgamento.

Se o regime for empreitada por preço global, há uma faixa de risco aceitável, dentro da qual não se ajusta o preço, mesmo havendo diferença entre orçado e executado.

Sugiro a leitura do Acórdão TCU 1977/2013-Plenário, que explica os conceitos.

Cito trecho do voto:

  1. Trata-se, em consequência, em algum termo, da transferência de imprecisões quantitativas para o particular, como ainda, de um esforço fiscalizatório menor, no que se refere à verificação em pormenores dos quantitativos de cada serviço. Embora os cuidados com a qualidade do objeto permaneçam, **não se fazem necessárias avaliações meticulosas e individuais de quantidades. ** Ao executar, por exemplo, um piso cerâmico de uma obra em uma empreitada por preço unitário, uma vez que se contrata um preço por unidades determinadas, pega-se a trena e se mede exatamente o que foi feito. Se as medidas indicarem que se executarem 100,5 m2, 100,5 m2 serão pagos (e não 100 m2). No preço global, de outro modo, como se contratou a obra por preço certo e total (se não houver modificação de projeto), uma vez que o piso da sala foi feito, remunera-se o previsto em contrato – ou exatamente 100 m2.

Márcio, se ainda estiveres interessado no assunto, pergunto: o empregado goza o intervalo intrajornada e não é substituído neste período? Ou seja, o edital não previu a figura do almocista ou jantista? Ou seja, rendição? O TCU tem entendimentos conflitantes: durante a sessão do pregão pode-se alterar a planilha, porém no decorrer do contrato ele manda simplesmente reduzir os valores considerados indevidos. Existem muitos acórdãos nesse sentido.

Com a devida vênia, a todas as teses jurídicas aqui expostas, eu entendo que qualquer valor pago com dinheiro público deve constar comprovadamente dos custo dos serviços públicos. Aposto se uma empresa privada pagaria a um fornecedor um custo inexistente, vou frisar custo inexistente.
Qualquer outra interpretação merece meu respeito, mas feito ou fazido, ou disse tá dizido, eu sou pela preservação de quem paga que é o cidadão.

Como falei no início respeito todas as considerações aqui exposta, mas esse é meu entendimento, e me valo do dito, Salvo, melhor juízo, pois não sou detentor da palavra final, quiça o STF, que muda sua interpretação a luz do bom direito, entende-se adequação do fato a norma.

1 curtida

Concordo com a tese do Justos, reduzir os valores indevidos, preservação do enriquecimento sem causa.