Dúvida sobre Exigência de Qualificação Técnica para "Fornecedor do Fornecedor" (Lei 14.133)

Caros colegas, juristas e técnicos de licitação,

Gostaria de compartilhar um caso prático e pedir a opinião de vocês sobre os limites das exigências de qualificação técnica, especialmente quando a segurança está em jogo.

Estou planejando uma Dispensa Eletrônica para fornecimento de gases industriais (Oxigênio, Acetileno e Argônio). A Análise de Riscos que elaborei apontou que o risco de maior impacto é a falha catastrófica de um cilindro. Para mitigar isso, o ponto-chave é garantir que a requalificação periódica dos cilindros (teste hidrostático/ultrassom) seja feita por um Organismo de Inspeção Acreditado (OIA) pelo INMETRO.

O dilema é como verificar a competência desse “fornecedor do fornecedor”, principalmente quando a relação entre ele e o licitante é apenas comercial, sem contrato formal.

A solução que encontrada é exigir, na habilitação, que o licitante apresente uma declaração com o CNPJ e a Razão Social do seu OIA parceiro, para que o Pregoeiro possa verificar a acreditação antes da adjudicação.

Minhas dúvidas para os colegas são:

  1. Validade Jurídica: Essa exigência de declaração com posterior verificação pelo Pregoeiro é uma medida legal e proporcional, ou poderia ser vista como restritiva demais para uma Dispensa Eletrônica?
  2. Dúvida Prática (Consulta ao INMETRO): Tive uma dificuldade real em realizar essa consulta diretamente no portal do INMETRO. Mesmo com o CNPJ e a Razão Social em mãos, as páginas de busca que encontrei não eram claras ou não possuíam os campos adequados, o que dificultou a confirmação da acreditação de uma empresa específica que me foi informada pelo fornecedor atual. Alguém teria um link direto funcional ou um passo a passo mais eficaz para essa verificação? Essa dificuldade de consulta é uma realidade conhecida por vocês também?
  3. Abordagens Alternativas: Vocês já implementaram ou viram mecanismos diferentes para auditar a cadeia de fornecimento em objetos de alto risco como este?

Agradeço imensamente qualquer contribuição, dica ou experiência que possam compartilhar.

#licitações lei14133 #contratosadministrativos #gestãoderiscos #qualificaçãotécnica #inmetro #segurançadotrabalho

Minha experiência com licitações (e dispensas) para aquisição de gases se resume a itens medicinais.
O Tribunal de Contas que audita o ente federativo em que estou não permite exigir registro de produto na ANVISA, autorização de funcionamento empresa emitida pela ANVISA, licença sanitária emitida pela VISA estadual/municipal, laudos de testes de qualidade, cerrificado de acreditação… nada disso como habilitação, pois ele entende que tais documentos não foram previstos em leis especiais sobre licitação

Já o TCU orienta a pedir, pois entende que as leis especiais que tratam sobre controle sanitário (as quais preveem a emissão dos documentos que eu cite) se encaixam na definição da Lei nº 14.133, art. 67, inciso IV.

O que o tribunal daqui permite é exigirmos, junto com a proposta, uma declaração de que a empresa terá tais documentos no momento da assinatura do contrato. Como algumas assinam as declarações sem nem ler direito, isso dá maior dor de cabeça (penalizar, realizar nova dispensa, etc etc).

Quanto à sua pergunta 3, se nenhum colega aparecer com uma solução já testada, eu sugiro que, no âmbito dos estudos técnicos preliminares (Eu sei, não são obrigatórios para alguns casos de dispensa de licitação, mas acho que no seu caso vale a pena fazer), você poderia enviar e-mails para as fabricantes perguntando sobre a existência de de documento que comprova que o produto por elas comercializado passou por Organismo de Inspeção Acreditado pelo INMETRO.
O próprio documento provavelmente vai citar a legislação e, ao consultá-la, você talvez se sinta mais seguro para tomar a decisão.

Especificamente sobre exigências de habilitação técnica em dispensas de licitação, também é importante você consultar o regulamento aplicável ao seu órgão.
O Decreto aqui do ente proíbe pedir documentação que não seja para prova de regularidade fiscal, social e trabalhista (é isso mesmo, até a jurídica ele cortou :sweat_smile:). Já no âmbito da Administração Pública Federal, é possível pedir, desde que haja justificativa.

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Me parece mais crítico, para mitigar o risco, avaliar a coisa durante a execução do contrato.

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Obrigado por sua rica contribuição.

Quero contextualizar. Sabe aquele acidente em Curitiba em uma empresa de recarga de gás? Explosão em fábrica de gás deixa um morto e dois feridos em Curitiba (PR), o proprietário do caminhão que aguardava abrir o portão é fornecedor aqui. Conversei com ele e ouvi o relato do acidente.

Essa atividade inspira muito cuidado, principalmente quando vemos o poder destrutivo dela.

É a primeira contratação que eu faço desse tipo de produto; anteriormente, era cobrada somente a documentação de praxe: habilitação jurídica, fiscal, social e trabalhista, qualificação econômico-financeira e atestado de capacidade técnica.

Minha maior preocupação é especificamente quanto ao bem-estar dos colaboradores que utilizam esses cilindros.

Estou lotado na secretaria de Viação e Obras e pesquisei as licitações da Secretaria de Saúde, onde é exigida documentação como autorização da ANVISA. No meu caso, não são gases medicinais.

Minha preocupação é: o que garante que os equipamentos que pressurizam os cilindros estão fornecendo a pressão necessária para atestar a integridade deles? Ou, caso seja teste por ultrassom, como posso ter certeza de que está sendo realizado de maneira correta?

Estou muito hesitante quanto a isso e não me sinto seguro em exigir apenas a qualificação de quem comercializa esses gases envasados. Gostaria de ter a garantia total da integridade dos cilindros, por isso gostaria de exigir a diplomação dos Organismos de Inspeção Acreditados pelo INMETRO que são fornecedores do meu fornecedor, eis meu impasse…

Fiz diligência a procuradoria para orientação quanto a isso e aguardo a resposta, não encontrei regulamento específico, porém adotamos a regulamentação da SEGES, e utilizamos os modelos federais.

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Obrigado pela colaboração. Acredito que a cobrança na habilitação ou durante a execução é algo importante sim, porém, minha maior dúvida ainda é sobre se posso cobrar. Estou aguardando orientação jurídica daqui, acredito que em breve poderei definir, mas apreciarei outras contribuições.

Bom dia! Vou tentar dar alguma contribuição, com base no conhecimento geral e na minha experiência, mas confesso que desconheço as particularidades do objeto.

Num primeiro momento, preciso fazer uma consideração em relação ao que você colocou:

Não existe forma de ter garantia total. O que você faz é minimizar os riscos, mas eles ainda existem e um risco residual sempre vai existir. Então, uma dica é que esta “oitiva” sua precisa constar dos estudos e da análise de risco:

Não pode ficar só no “um fulano disse”. Relatos são também importantes, e precisam ser reduzidos a termo e constar do processo para embasarem as decisões. Mas não só o relato dele: se esse acidente é um evento importante, precisa reunir mais informações sobre as causas (em geral, num acidente nunca é uma só) e buscar agir na prevenção delas.

Dito isso, a Lei nº 14.133/2021 traz no § 6º do art. 17 a previsão de exigência de certificação acreditada pelo INMETRO:

§ 6º A Administração poderá exigir certificação por organização independente acreditada pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro) como condição para aceitação de:
(…)
III - material e corpo técnico apresentados por empresa para fins de habilitação.

Isso você já sabe. Aí cabe tentar ver em qual parte se enquadra melhor o momento, a forma de exigir e de verificar a certificação.

A meu ver, o que você chama de “qualificação técnica” do “fornecedor do fornecedor” não necessariamente precisa ser na habilitação (e realmente acho que não deve, por uma impropriedade), como um critério de qualificação técnica. Essa possibilidade de exigir algo do “fornecedor do fornecedor” existe, por exemplo, em questões de sustentabilidade, como a certificação da origem da madeira utilizada, só que isso é exigido como critério de aceitabilidade do objeto, e não de habilitação. O fornecedor licitante que fabrica e entrega o móvel comprou a madeira de algum outro fornecedor da matéria prima, e este último é quem tem a certificação. Porém, cobra-se do licitante que ele apresente a certificação da madeira que usou.

E aceitabilidade do objeto não diz respeito somente a requisitos físicos do bem material, do cilindro no caso, mas também a requisitos do objeto relativos à forma de fornecimento e de execução do serviço relacionado, que no caso aparentemente são tão importantes quanto o bem de fato entregue.

Já como item de qualificação técnica na habilitação, posso estar equivocado mas entendo que seja difícil estender as exigências ao “fornecedor do fornecedor”, pois foge à finalidade da habilitação, já no caput do art. 60, além do entendimento restrito já consolidado em relação ao que pode ser exigido.

conjunto de informações e documentos necessários e suficientes para demonstrar a capacidade do licitante de realizar o objeto

Em resumo, de forma simplificada minha sugestão é: inserir como critério de aceitabilidade do objeto esse tipo de exigência de requisito do “fornecedor do fornecedor”, se for julgado indispensável.

Espero ter contribuído e peço desculpas se alguma das considerações acabou ficando mais geral e não se encaixou nas particularidades da sua contratação, pois infelizmente não tenho conhecimento específico sobre as particularidades. Fui apenas com base no que você relatou.

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Obrigado pela aula. acho q vou nesse sentido.

Um adendo, o relato do fornecedor sobre o acidente foi uma conversa informal mesmo, não faz parte do ETP, apenas serviu de alerta aos riscos da atividade. também foi realizada uma análise de riscos onde foram abordados os riscos de potencial catastrófico relacionados a integridade dos cilindros, com base nesse relato e em outras fontes.

Com a sua contribuição e as anteriores vou finalizar meus docs e mandar pra análise da licitação.

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