Direito à repactuação

Prezados colegas,

Uma empresa ganhou licitação em 12/2021 utilizando a CCT com vigência de 01/01/2021 a 31/12/2022. Porém, assim que iniciou a execução, em janeiro de 2022, ela solicitou repactuação baseada em uma cláusula da mesma CCT informando que a partir de 2022 o salário deve sofrer reajuste. Terá direito a tal repactuação? E se outra empresa que foi desclassificada utilizou o salário de 2022 na proposta contestar?

Grato pelas colaborações que responderem.

João Oliveira
MJ/PF

Boa noite, João!

Acredito que há similaridade entre seu caso e outro que apareceu recentemente por aqui.
Ao meu ver, você questiona acerca de um novo direito (podemos assim dizer) que surgiu após o resultado adjudicatório, correto? Ou seja, a empresa solicitou a repactuação para corrigir o valor no ano vigente e naturalmente esse valor será diferente daquele adjudicado.

Diante disso, se eu entendi bem sua dúvida, colarei aqui a mesma resposta que deixei em outro questionamento similar (farei pequenos ajustes para melhor se adequar ao seu caso específico).

Dividirei meu pensamento por tópicos.

I - Há de se obversar o importante Princípio da Vinculação ao Instrumento Convocatório, o qual preconiza a forte ligação entre o Licitante e o conteúdo editalício.
Dito isto, oriento que seja observado o conteúdo expresso no edital. Inclusive, a vinculação ocorre simultaneamente, de modo que a Administração Pública também vincula-se às regras ali prescritas. Repito: atenção ao edital.

II - Diante do que já foi exposto, acredito que o Contrato deve ser assinado com as condições adjudicadas no Processo Licitatório. Afirmo isto uma vez que, neste caso, o contrato vem formalizar um ato jurídico/administrativo que já aconteceu, com condições pré-estabelecidas, de modo que não seria razoável a existência de valor diferente na adjudicação por menor preço em relação ao Contrato redigido.

III - Para embasar melhor meus apontamentos, acho pertinente citar o Acórdão 474/2005 - Plenário - Tribunal de Contas da União - TCU. O referido instrumento origina-se do seguinte questionamento feito: “haveria possibilidade de atualização ou correção monetária dos preços propostos antes da celebração do contrato quando, entre a apresentação da proposta e a assinatura do contrato, transcorrer mais de um ano?”. Sigamos…
Ora, é notória a similaridade com seu caso, embora não seja exatamente igual. O objeto da pergunta é exatamente a possibilidade de reajuste de um contrato antes mesmo de sua assinatura. Dito isto, vamos à resposta do TCU…

Para o Tribunal, há sim a possibilidade de correção de valores em decorrência de direito que surgiu antes da celebração de um contrato (como é o seu caso nesse reajuste da CCT 2022/2023). Neste sentido, a orientação é a seguinte: realizar a elaboração do contrato dentro dos valores fixados no Processo Licitatório e seguidamente já emitir a repactuação alterando os valores contratuais.

Para que não fique em minhas palavras, deixo o item 9.1.2 do acordão:

(…)consiste em firmar o contrato com os valores originais da proposta e, antes do início da execução contratual, celebrar termo aditivo reajustando os preços de acordo com a variação do índice previsto no edital.

IV - Diante dessas exposições pode ainda surgir a dúvida acerca da possibilidade de haver o instrumento de repactuação antes do prazo mínimo de 12 (doze) meses. E, sobre esse questionamento, respondo seguramente que poderá, sim, ser realizado.
A primeira repactuação deve acontecer quando houver a variação salarial da categoria, independendo do tempo da assinatura do contrato. Porém, atente-se que isto vale para primeira repactuação, as demais deverão atender ao prazo mínimo.
A fim de embasar meu apontamento, trago o Acórdão 2255/2015 - Plenário do TCU:

Repactuações dos contratos de prestação de serviços de natureza contínua subsequentes à primeira repactuação devem observar o prazo mínimo de um ano, contado a partir da data da última repactuação, a qual deve ocorrer uma única vez, no mesmo período.

Ora, é simples perceber que a partir do momento que há aplicação do prazo mínimo nos atos subsequentes à primeira repactuação, torna-se possível entender analogicamente que a primeira repactuação não está condicionada a este prazo anual (12 meses).

V - Conclusão

  1. Há plena legalidade no ato de celebrar ajuste no valor do contratação, por força de nova CCT, mesmo antes de atingir 12 meses de vigência contratual. Logo, há o direito à repactuação.
    2.Inclusive, seria plenamente irrazoável aceitar o fato de que a Administração Pública pagaria, por 01 ano, um valor inferior àquele fixado por instrumento legal e em pleno vigor.

Registro que, embora fundamentados, meus apontamentos são meramente opinativos e sem prejuízo de melhores juízos.
Espero ter auxiliado!

Caso queira acompanhar na íntegra o caso que eu julguei simular ao seu, segue o link: Clique aqui

@Oliveira!

O interregno de um ano, que é obrigatório para fins de conceder a repactuação, começa a contar da data em que começaram os efeitos do instrumento coletivo adotado pela empresa na elaboração de sua proposta, e cada empresa pode ter instrumento coletivo distinto (CCT, ACT, DCT, SN etc), com data base distinta, e não tem absolutamente nada de errado com isto, pois é assim que a CLT fixa as normas de enquadramento sindical. Cada empresa se vincula ao instrumento coletivo ao qual os seu funcionários têm direito, conforma atividade preponderante da empresa, em regra. Situações específicas, como categorias profissionais regulamentas por lei, fogem dessa regra.

Ou seja, se, ao assinar o contrato o instrumento coletivo usado pela empresa na elaboração da proposta já tiver completado um ano, é devida a repactuação sim. E não tem nada a ver com o instrumento coletivo usado pela Administração para fins de estimativa de custos. Isto não vincula ninguém. Não no sentido de obrigar a empresa a usar o mesmo instrumento coletivo.

O que o edital deve deixar claro, é que cada empresa deve usar o seu próprio instrumento coletivo, com base na regra legal de enquadramento sindical (sim, ela não tem o direito de escolher), vigente na data da abertura da licitação. Ou seja, se ao abrir a licitação em 12/2021, os instrumentos coletivos vigentes eram referentes a 2021, não há nenhuma possibilidade de qualquer empresa ter usado instrumento coletivo de 2022, pois nem existia ainda.

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Obrigado pela resposta, Hugo. Não há o que se discutir quando há uma nova CCT. Porém, no caso exposto, não houve nova CCT. A empresa ganhou a licitação em 12/2021 e em 01/2022 requereu repactuação (na verdade acho que seria reajuste, e aí teria que esperar um ano) pelo IPCA do período de jan/2021 a dez/2021.