Lucro Real - aplicação de tributação média dos últimos 12 meses

Acho que entendi seu ponto de vista, Alecxandre.

Me permita, por favor, propor contrapontos aos seus argumentos. Debater, respeitosamente, está na essência do Nelca. Todos aprendemos e ganhamos com discussões saudáveis.

Todas as empresas, em tese, são diferentes. Há distintas estruturas de funcionamento, estratégias, gerenciamento e custos. Há até mesmo as distinções promovidas diretamente pelas regras legais, como regimes tributários, normas trabalhistas, benefícios e ônus próprios de cada tipologia empresarial.

Isso faz com que cada empresa, na condição de licitante, interessado em disputar uma contratação no setor público, atue de modo diferente dos seus concorrentes. E nesse sentido, pode propor valores variados, em função de suas peculiaridades. Faz parte do jogo.

Quando colocamos em disputa um serviço, pelo menor preço, estarão em campo os diversos componentes de custos que influenciam a formulação das propostas.

Assim, empresas com realidades tributárias diferentes entrarão na disputa. E o que vai nos interessar, de fato, ou que deveria nos interessar, é o preço global - e se tal valor está compatível com o preço estimado e não representa risco inaceitável de inexequibilidade. Os componentes de custo são referenciais relevantes, mas devem ser sopesados pelo conjunto.

Nunca entendi plenamente, ou pelo menos nunca concordei, com a lógica de exigir ‘comprovação’ das médias de tributação a que o licitante esteve submetido antes da licitação. Primeiro, porque tal comportamento histórico não garante o desempenho no futuro. Segundo, porque é inviável, em geral, comprovar a veracidade dos dados apresentados. Terceiro, porque gera custo administrativo de verificação, análise, incertezas sobre decisões relacionadas. Quarto, porque o valor global é que interessa, então, mesmo que haja incerteza sobre a precisão estimativa dos custos tributários, isso só teria impacto efetivo na avaliação da exequibilidade da proposta, uma vez que a licitante pode até remanejar os valores individuais de componentes da planilha, mantendo a oferta global, sem que isso represente afronta à legalidade do certame. A planilha é instrumental, não um fim em si mesma.

Não é errado que a licitante possa auferir lucro superior àquele estimado explícitamente em sua planilha, desde que a execução seja regular, atendendo às obrigações pactuadas. Esse é um debate extremamente delicado, reconheço. Venho travando uma longa batalha sobre isso, em especial do ponto de vista da modelagem das contratações de serviços e a forma de fiscalização da execução. Discussões anteriores no Nelca tocando o assunto podem ser lidas, por exemplo, AQUI, AQUI, AQUI

Aliás, me parece que uma margem de lucro maior pode até ser benéfica para o contratante. Ofertas com lucros irrisórios tendem a representar maior risco de falhas ou dificuldades na execução do contrato. Os números que apresentei no texto Subsídios para gestão de riscos em terceirização: estatísticas de contratos federais mostram taxas distintas de rescisão contratual em certas condições, como porte do contratado e o volume financeiro do contrato, assim como histórico de ocorrências do fornecedor no Sicaf, tempo de cadastro no Sicaf em relação ao ano de assinatura do contrato, proporção entre o capital social do contratado e o valor inicial do contrato.

Isso indica que diversos fatores podem influenciar os riscos durante a execução contratual. A margem de lucro talvez seja um desses fatores. Gostaria muito de pesquisar mais a esse respeito, buscando, por exemplo, comparar taxas de rescisão relacionadas com a margem de lucro estimada nas planilhas vencedoras das licitações.

Enfim, escrevo tudo isso para fundamentar minha opinião de que o histórico de desempenho tributário do licitante não me parece um elemento capaz de influenciar a isonomia da disputa, considerando que tal histórico seja amparado em regras legais. Obviamente que uma empresa que esteja atuando de forma irregular, em termos tributários, tem, aí sim, vantagem competitiva indevida. Enquanto a vantagem for originada de permissivos da lei, não vejo como atacar a situação. Eventualmente, as regras tributárias podem ser contestadas, dado o seu caráter de política pública, mas isso é outro debate, inerente ao jogo democrático.

Como em qualquer outro debate, posso estar errado. E posso ser convencido disso, com argumentos que se mostrem mais sólidos que os meus. Eu prefiro não ter aquela velha opinião formada sobre tudo.

Obrigado por compartilhar suas inquietações, Alecxandre. Esse é espírito da cooperação que procuramos estimular no Nelca.

Espero ter contribuído.

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