Art. 47 e 48 da lei complementar 123/2006 - interpretação

Prezados, boa tarde. Hoje me deparei com a seguinte questão, gostaria de saber a opinião de vocês. Grato.

Lei 8.666/1993
Art. 3º (…)
§ 1º É vedado aos agentes públicos:
I - admitir, prever, incluir ou tolerar, nos atos de convocação, cláusulas ou condições que comprometam, restrinjam ou frustrem o seu caráter competitivo, inclusive nos casos de sociedades cooperativas, e estabeleçam preferências ou distinções em razão da naturalidade, da sede ou domicílio dos licitantes ou de qualquer outra circunstância impertinente ou irrelevante para o específico objeto do contrato, ressalvado o disposto nos §§ 5o a 12 deste artigo e no art. 3º da Lei no 8.248, de 23 de outubro de 1991;

Essa é a parte geral, vedando a conduta discriminatória em razão, dentre elas, da sede ou domicílio dos licitantes.

Daí partimos para análise da norma específica:

Lei Complementar 1236/2006

Art. 47. Nas contratações públicas da administração direta e indireta, autárquica e fundacional, federal, estadual e municipal, deverá ser concedido tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte objetivando a promoção do desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal e regional, a ampliação da eficiência das políticas públicas e o incentivo à inovação tecnológica.

Art. 48. Para o cumprimento do disposto no art. 47 desta Lei Complementar, a administração pública:

I - deverá realizar processo licitatório destinado exclusivamente à participação de microempresas e empresas de pequeno porte nos itens de contratação cujo valor seja de até R$ 80.000,00 (oitenta mil reais);

(…)

1º O tratamento diferenciado que alude o Art. 47 e 48 I é norma geral?

2º No âmbito municipal pode o chefe do executivo local regulamentar o dispositivo de modo diverso do chefe do executivo federal?

3º Como deve ser tratada a expressão: objetivando a promoção do desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal e regional?

4º Se o princípio da especialidade revela que a norma especial afasta a incidência da norma geral “Lex specialis derogat legi generali” pode o chefe do executivo municipal dar um tratamento mais especial para as suas condições locais ou para o desenvolvimento no âmbito municipal, por exemplo, uma licitação exclusiva para as MPE de sua sede ou proximidades?

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Boa noite,

Ao menos o TCE-PR já consolidou que sim, é possível!

Da uma olhada nesse prejulgado n 27

https://www1.tce.pr.gov.br/multimidia/2019/8/pdf/00339015.pdf

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Bom dia, Tulio.

Eu não faria essa restrição, tendo em vista a vedação explícita do § 1º do Art. 3º da 8.666, a não ser que houvesse uma motivação muito robusta que justificasse a restrição da competitividade por domicílio da empresa. No presente momento não me ocorre nenhuma hipótese, embora, evidentemente, possa existir.

Sobre o que pode significar a menção ao desenvolvimento municipal e regional no Art 47 da LC 123/2006, podemos supor, por exemplo, que licitações exclusivas para ME/EPP tenderiam a propiciar tal desenvolvimento visto que, pelo vulto, é pouco provável que empresas distantes participem, ainda mais sendo elas também ME/EPP. As empresas teriam que gastar com frete e/ou instalação de escritórios ou prepostos na cidade onde ocorre a licitação, para um lucro muito baixo. Isso é muito comum aqui quando compramos, por exemplo, materiais para manutenção predial, como soquetes, pregos e etc. É exclusivo ME/EPP e nenhuma empresa de outra cidade participa, embora seja facultada sua participação. O mesmo se aplica a outros pregões com valores dentro da margem de preferência. São exemplos concretos de “ promoção do desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal e regional” , sem que, para isso, precisemos passar por cima da vedação explícita do § 1º do Art. 3º da 8.666. Simplesmente não é atrativo para ME/EPPs de outras regiões.

No entanto, caso algum colega tenha um exemplo de motivação para restringir a competitividade ao município ou região, fiquei até curioso.

1º Sim. Item abaixo de R$80.000,00 é exclusivo ME/EPP. O Compras.net ordena automaticamente.

2º Não sei, embora ache que não faria sentido.

3º Dei minha hipótese no segundo parágrafo.

4º Não sei.

Espero que ajude, de alguma forma.

Att.,

Daniel

UFG

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Bom dia @Tulio_Silveira úlio;

Lei n° 8.666/93 - Art. 3° A licitação destina-se a garantir a observância do princípio constitucional da isonomia, a seleção da proposta mais vantajosa para a administração e a promoção do desenvolvimento nacional sustentável

Sim.

A competência legislativa é concorrente, podendo União, Estados, Distrito Federal e Municípios, regulamentarem no âmbito de suas competências. Claro, desde de que tais regulamentos não afrontem dispositivos legais.

Com tratamento favorecido, diferenciado e simplificado.

Te oriento a ler o Decreto 8.538/15, principalmente o art 9°, mas lembro que o referido decreto trata a regulamentação no âmbito a APF.

Nesse sentido, na minha opinião, é possível que normas com o mesmo sentido regulem a matéria em Âmbito estadual e municipal.

Espero ter ajudado.

THIEGO RIPPEL PINHEIRO

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Coordenadoria de Sistematização de Deliberações e Jurisprudência

Belo Horizonte | 1º de novembro a 30 de novembro de 2019 | n. 207

O Informativo de Jurisprudência do TCEMG consiste em resumos elaborados a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Câmaras e do Tribunal Pleno, mas não se trata de repositório oficial de jurisprudência. Contém, ainda, seleção de ementas publicadas no Diário Oficial de Contas – DOC – e matérias selecionadas oriundas do STF, do STJ, do TCU e do TJMG.

Primeira Câmara

Considera-se plausível a limitação imposta à localização geográfica das empresas participantes do certame com o intuito de fomentar o comércio local e regional

Tratam os autos de Denúncia, com pedido liminar, formulado por empresa em face de procedimento licitatório deflagrado por prefeitura municipal, objetivando futura e eventual aquisição de material de expediente para atender às necessidades de diversas secretarias municipais.

Aduziu a denunciante que o edital contém cláusula restritiva à competição, na medida em que limita a participação no certame às empresas que estejam localizadas a uma distância de até 120 (cento e vinte) quilômetros da sede do município. Sustentou, ainda, ser irregular a justificativa contida no instrumento convocatório, no sentido de que tal exigência encontrou amparo na legislação municipal, pois, de acordo com a denunciante, a futura e eventual aquisição de materiais de expediente não caracteriza demanda urgente e imediata, fugindo às hipóteses autorizadoras de restrição geográfica relacionadas no Decreto Municipal.

Inicialmente, o relator, conselheiro substituto Hamilton Coelho, destacou que a limitação geográfica imposta no edital foi devidamente justificada no Termo de Referência, como tentativa de fomento ao comércio local/regional que, com fundamento em Lei Municipal que dispõe sobre a Lei Geral de Micro e Pequena Empresa, editou Decreto Municipal, cuja redação trouxe o privilégio geográfico às empresas locais/regionais situadas a uma distância de até 120km do município. Do exame dos autos depreendeu, ainda, que, apesar de a denunciante advogar a tese de que a vertente hipótese de contratação não se enquadraria naquelas previstas no decreto municipal, por não se tratar de demanda urgente e imediata, a republicação do edital que havia sido suspenso se deu exatamente em razão da demanda premente pelos produtos licitados, consoante se vislumbra na justificativa, tendo sido informada a existência de grave risco de paralisação das atividades cotidianas da Administração. Assim, considerou que a argumentação contida na exordial não merecia ser acolhida.

Ressaltou que a delimitação geográfica prevista no instrumento convocatório encontra respaldo no disposto no art. 47 da Lei Complementar n. 123/06, que preceitua que, nas contratações públicas da administração direta e indireta, autárquica e fundacional, federal, estadual e municipal, deverá ser concedido tratamento diferenciado e simplificado para as microempresas e empresas de pequeno porte objetivando a promoção do desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal e regional, a ampliação da eficiência das políticas públicas e o incentivo à inovação tecnológica. Ademais, salientou que o critério foi previsto no edital e justificado no termo de referência, tendo sido observado o enunciado inserto no art. 49, inciso I, da referida lei complementar, que determina que o tratamento diferenciado não se aplica caso não forem expressamente previstos no edital.

Verificou a existência de precedentes desta Corte de Contas no sentido de ser aceitável a restrição geográfica em situações similares à hipótese dos autos, a exemplo da Denúncia n. 1012006, de relatoria do Conselheiro José Alves Viana, em cujo decisum julgou-se razoável a exclusividade de contratação para empresas sediadas no município ou num raio de 100km, especificada no edital, por fomentar o desenvolvimento econômico e social local, nos termos da Lei Complementar n. 123/06. No mesmo sentido, citou a Denúncia n. 1058765, Segunda Câmara, Rel. Cons. Gilberto Diniz, julgada em 30.5.19; a Denúncia n. 1040744, Primeira Câmara, Rel. Cons. José Alves Viana, julgada em 3.9.19 e a Denúncia n. 980583, Segunda Câmara, Rel. Cons. Gilberto Diniz, julgada em 24.5.18.

Por todo o exposto, considerou razoável a opção do administrador por delimitar a participação de empresas sediadas no município ou num raio de 120km, por estar de acordo com os preceitos da Lei Complementar n. 123/06, promover o desenvolvimento econômico e social no âmbito municipal e regional, além de garantir a sustentabilidade exigida nas contratações públicas, manifestando-se pela improcedência da Denúncia. A proposta de voto foi aprovada por unanimidade pelo Colegiado da Primeira Câmara. (Denúncia n. 1066685, Rel. Cons. Substituto Hamilton Coelho, 05.11.2019). Vídeo da sessão de julgamento: TVTCE 1h20m43s

https://www.tce.mg.gov.br/noticia/Detalhe/1111624200#2

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Olá pessoal,
Essa preferência por microempresas sediadas local ou regionalmente foi, conforme já mencionado nessa discussão, regulamentada, em nível federal, pelo Decreto 8.538/15. Este é alvo de algumas críticas por parte da doutrina, pela sua tímida eficácia, dado que apenas oferece à MPE sediada em determinada área a possibilidade de cobrir o preço de outra MPE, tal qual a sistemática do empate ficto entre MPE e outras empresas.
Por outro lado, alguns entes regulamentaram a matéria concedendo verdadeira preferência às MPE sediadas em determinada área, a exemplo do Município de São Paulo (Dec. 56.475/2015).
Minha pergunta aos colegas é sobre que tipo de regulamentação o ente em que trabalham adotou, a espelhada no Decreto Federal ou no Decreto de SP capital?
E como tal margem de preferência (para MPE local ou regional) pode ser usada no pregão eletrônico? Ou exigiria a forma presencial para sua aplicação? Esclareço que conheço apenas razoavelmente dos sistemas de pregão eletrônico, pois nunca atuei como pregoeiro.
Desde já agradeço muito pela participação.

A tal margem de preferencia, penso que primeiro o ente precisa definir o que seria LOCAL e o que seria Regional. Ex. Se o ente não definir (Município - Decreto), quais os bairros ou até onde será considerado local e até onde será considerado regional. Fica difícil.